• Cuiabá, 04 de Julho - 00:00:00

A reestatização da BR-163

Foi assinado nesta terça feira (04) um acordo administrativo entre o estado de Mato Grosso e a Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, para transferir a concessão da rodovia federal BR 163 para a empresa de investimentos do governo estadual MT Participações. O acordo, feito por meio de um instrumento jurídico denominado Termo de Ajustamento de Conduta, envolve ainda a atual detentora da concessão, Rota do Oeste S/A. Por meio da MT Participações S/A, a administração estadual adquiriu o controle da Rota do Oeste e a ANTT aceitou a transferência da concessão, evitando, assim, retomar e relicitar a operação.

A complexa operação pode ser analisada sob os prismas comercial, operacional e de imagem.

Sob o espectro comercial, é uma operação de elevado risco financeiro. A operação nunca foi geradora de lucro para a concessionária, segundo suas próprias demonstrações apresentadas em diversas audiências pública sobre o assunto. Pelo acordo de transferência do controle da empresa, o governo do estado assume todas as dívidas bancárias da concessionária perante os bancos. O montante dessa dívida ainda não foi tornado público. A MT Participações se compromete a duplicar todo o trecho da rodovia de Cuiabá até Rosário Oeste e do entroncamento do Posto Gil até Sinop, envolvendo, ao todo, aproximadamente 500 km nos próximos oito anos, contados a partir de janeiro de 2023. E construir as delicadas e necessárias travessias urbanas em cidades como Jangada, Nova Mutum, Lucas do Rio Verde e Sinop. A MT Par anunciou que investirá R$ 1,2 bilhão para duplicação de alguns trechos nos próximos três anos. Estima-se que para duplicar todo o trecho serão necessários aproximadamente R$ 3 bilhões.

Para operar com excelência a concessão, a estatal mato-grossense  terá que investir para melhorar a estrutura operacional recebida da concessionária na área de gestão das praças de pedágio, manutenção, reparos e primeiros socorros ao longo dos mais de 800 km da concessão. Precisará, como empresa de economia mista, licitar a contratação das empreiteiras que farão a pavimentação e duplicação, enfrentando todo o emaranhado burocrático da lei de licitações.

Na questão de imagem, a administração estadual movimenta-se em terreno movediço. A possível demora na execução das duplicações fatalmente acarretará mais insatisfações dos usuários. Atualmente, os problemas da operação, como má qualidade do pavimento, falta de duplicação, elevado índice de acidentes com mortes, altas tarifas de pedágio são jogados nas costas da concessionária e, em última análise, no governo federal. A partir da transferência da concessão, todo o desgaste da operação será direcionado para o governo do estado, sem amortecedores privados ou federais. No dia seguinte ao anúncio da transferência da concessão, a ANTT tornou público que as tarifas dos pedágios serão reajustadas a partir do dia 18 próximo. Perversa coincidência.

A reestatização da concessão navega na contramão dos esforços dos governos estadual e federal que atuam para reduzir a participação do estado na modernização e ampliação da infraestrutura do país. São amplamente conhecidos os programas federal e estadual de  privatizações de rodovias, portos fluviais e marítimos, aeroportos e ferrovias. A BR 163 era administrada pela administração federal, teve sua operação concedida à iniciativa privada e agora retorna à gestão estatal. Uma aparente contradição.   

Chama atenção como uma operação que nunca funcionou a contento, desde o seu início, não conseguiu solução mercadológica satisfatória. Como, por exemplo, transferir a outro grupo privado mais robusto e especializado, o controle da Rota do Oeste. O esforço das lideranças políticas e empresariais do estado não foram suficientes para encontrar uma solução de mercado ou a devolução administrativa da concessão. Nesse ínterim, a economia do estado sofre com a má qualidade da rodovia, encarecimento dos fretes e as famílias choram as mortes dos seus entes queridos. Talvez tenha sido esse gatilho sócio-econômico que levou o governo estadual a desenvolver uma solução atípica, diante da posição insensível e passiva da administração federal.

 

Vivaldo Lopes é economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em  MBA Gestão Financeira Empresarial-FIA/USP  (vivaldo@uol.com.br)



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