Os Regimes Próprios, em regra, incluem no rol de beneficiários da pensão por morte os cônjuges ou companheiros do servidor falecido e exigem para a concessão do benefício apenas e tão somente a comprovação dessa condição, já para estes a dependência econômica é presumida.
Não havendo, portanto, em tese, qualquer discussão acerca dos motivos que levaram ao casamento ou mesmo a veracidade dos sentimentos que o motivaram.
Ocorre que a partir do ano de 2.015 diversos Regimes Próprios introduziram em suas leis previsão no sentido de que uma vez evidenciado que o casamento foi realizado apenas e tão somente com o objetivo de obtenção da pensão por morte é possível a cessação do benefício, por se constituir tal procedimento em fraude.
De forma que, a partir de então, os Regimes Próprios passaram a contar com fundamento legal para revisão dos benefícios nesses casos.
Ocorre que o Supremo Tribunal Federal ao julgar o Mandado de Segurança n.º 29.310 decidiu que:
DECADÊNCIA – MÁ-FÉ. Uma vez verificada má-fé, não se tem a incidência do prazo decadencial previsto no artigo 54 da Lei nº 9.784/1999.
PENSÃO – CASAMENTO – FORMAL VERSUS REAL.
Surgindo de contexto fático o objetivo de, mediante casamento (tio juiz classista, aos 72 anos, com doença terminal, e sobrinha de 25 anos), alcançar-se, em detrimento do erário, pensão, tem-se a impossibilidade de concluir-se pela existência de direito líquido e certo ao benefício.
VERDADE – PLATÃO.
“É preciso tender para a verdade, com toda a alma, com o coração e a inteligência.”
A demanda judicial trata de uma pensão por morte concedida, no âmbito do Regime Próprio da União, no ano de 2.005, quando não existia a previsão expressa de cessação do benefício pela natureza fraudulenta do casamento.
Ainda assim, o Ministro Marco Aurélio, relator do Mandado de Segurança, reconheceu que a fraude do casamento decorrente do fato de seu único intento residir na obtenção do benefício se constitui em má-fé que afasta o direito ao mesmo.
Afirmando que:
Sob o ângulo do prazo decadencial previsto no artigo 54 da Lei nº 9.784/1999, observem haver ocorrido, no Tribunal de Contas, o enquadramento na exceção prevista. Assentou-se, a partir de dados concretos, a má-fé e, então, glosou-se a pensão.
O caso é realmente estarrecedor e mostra que não se tem respeito maior pela fidelidade de propósito, respeito maior com a coisa pública. Eis os fatos: juiz classista, aos 72 anos e à beira da morte, tanto assim que veio a falecer 4 meses após o casamento, com câncer terminal na próstata, contraiu – repita-se, aos 72 anos – matrimônio com sobrinha de, à época, 25 anos de idade. A diferença entre eles aproximava-se dos 47 anos.
Portanto, tomando por base a dita decisão, é possível concluir que, uma vez comprovado que o casamento teve por intuito apenas e tão somente a obtenção do benefício, resta caracterizada a má-fé que autoriza a cessação da pensão por morte.
O que pode alcançar benefícios concedidos a mais de 5 (cinco) anos, pois como consta do próprio acórdão a decadência não se opera nos casos de má-fé.
Bruno Sá Freire Martins, servidor público efetivo do Instituto de Previdência do Estado de Mato Grosso - MTPREV; advogado; consultor jurídico da ANEPREM, da APEPREV e da APPEAL; pós-graduado em Direito Público e em Direito Previdenciário; professor de pós-graduação; membro do Conselho Editorial da Revista de Direito Prática Previdenciária da Paixão Editores; escreve todas as terças-feiras para a Coluna Previdência do Servidor no Jornal Jurid Digital (ISSN 1980-4288 - www.jornaljurid.com.br/colunas/previdencia-do-servidor), para os sites fococidade.com.br e entrefala.com.br, autor dos livros DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO, A PENSÃO POR MORTE, REGIME PRÓPRIO – IMPACTOS DA MP n.º 664/14 ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS e MANUAL PRÁTICO DAS APOSENTADORIAS DO SERVIDOR PÚBLICO, todos da editora LTr, do livro A NOVA PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS (editora Alteridade) e de diversos artigos nas áreas de Direito Previdenciário e Direito Administrativo.
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