• Cuiabá, 16 de Junho - 00:00:00

Onde está o Jardim?

Ser humano algum nasceu para ser uma ilha. Não nasceu, nem tem a potencialidade para tal, mesmo que por vezes viesse, e vem a se recolher em um estado de solidão. Ainda que alguém quisesse sê-lo, talvez movidos pela introspecção que lhes é bastante forte, ou por conta da recheada conta bancária, ou pela falta de dinheiro. Não conseguiria ser a ilha, pois, afinal, jamais seria autossuficiente, embora possa ser autóctone, e isto o torna um dependente de outrem. Nasceu e foi, logo, levado a se acostumar com gente ao seu redor. Então, teve que aprender a se comunicar.

Assim como fizeram seus antepassados, fazem os que estão a sua volta, ou mesmo distantes, e farão os que virão. Todos se comunicam. Sempre, independente das dificuldades existentes. Conversar, dialogar e comunicar são conjugados cotidianamente. Ainda que não saiba o tempo, nem o modo, tampouco vozes, mas sabem que verbos são ações, estado, processo ou fenômeno, embora se perca ao flexiona-los, mudando tudo, uma vez que lhe escapa do controle que as orações e os períodos desenvolvem-se em torno de um verbo. Mas isso, de forma nenhuma, impede-o de se comunicar. Claro que não, a despeito “do português ruim”, como diz o trecho da letra de uma das canções.  

Todos se comunicam. Tímidos, retraídos, introspectivos, extrovertidos, falantes, não falantes ou pouco-falantes. O falar faz parte do viver humano. Tanto que tem diminuído distancias, rompido dificuldades, apesar de linguagens distintas. As redes sociais se tornaram, ou deveriam ser instrumentos de facilitação, de mais e mais comunicação, diálogos, quebrando “o gelo” impostos pelas barreiras.

Foi isso que se imaginou, ou se acreditou que seria. Ledo engano! Pois, ultimamente, a intolerância, sempre bastante forte, se espalhou com rapidez inimaginável pela Internet. Abriu-se uma cratera. Cratera em que fora depositada a compreensão, compaixão, solidariedade e retirou-se dessa mesma cratera as agressões, os ataques desmedidos, tornando assim “a vida de muitos um inferno”, com a insubmissão a disciplina pela patologia do ódio, protagonizado pelos ferrolhos morais e pela ideia estereotipada, desencadeadora do preconceito, o qual reforça e muito a desigualdade social. Processo crescente da xenofobia, homofobia, misoginia.

Discurso que tem o seu público. Público que o apoia e o aplaude. Por mais que não se queira acreditar nisso. Mas tem. Infelizmente! Quem não associa a ele, logo é excluído, e tido como inimigo. Inimigo que deve ser eliminado. E o elimina sempre, ainda que se tenha, e tem mesmo a bíblia debaixo do braço. “Script” antigo. Endossador da exclusão dos diferentes.

Outro dia, em um grupo de whatssap, a defesa da criação de um conselho estadual, foi o estopim de um “quebra-pau” danado. Amigos de antes, só porque se posicionaram a favor do conselho, tornaram-se inimigos, e membros de um mesmo núcleo familiar, considerados estranhos, tidos por outrem como “contrários à família, à religião”. As palavras de Cristo foram distorcidas. A despeito, contudo, dos preceitos da religião cristãs: “faça aos outros o que desejaria que eles fizessem a ti” e “ama a teu próximo como a ti mesmo”.

Anuviou-se tudo. Escurecia o céu. Nuvens escuras dos dejetos sobrepuseram o alvo das águas. Tanto que não mais podiam ver o que se passava no fundo do córrego que, anteriormente, servia para juntar os moradores da região, aproximarem as pessoas.

Vive-se outro momento. Momento em que o relógio do tempo é movido pelo vento da intolerância. Intolerância que subtrai o humano do ser, e o torna o mais feroz dos animais, muito aquém do que deveria ser, ainda que se possa um dia se tornar, mesmo diante da pandemia do preconceito, que destrói todo o canteiro da compreensão e mata o jasmim do jardim do Éden. É isto.

 

Lourembergue Alves é professor universitário e Analista Político. 



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