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Política, moral e sanção

  • Artigo por Gonçalo Antunes de Barros Neto
  • 04/08/2021 11:08:07
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            A sanção é a característica geral dos fatos morais e jurídicos. Durkheim se refere aos fatos morais como física dos costumes (Lições de Sociologia, edipro, 2015, tradução: Cláudia Schilling), e para quem ambos consistem em regras de conduta sancionadas.

            A história e a etnografia comparadas nos fazem desvendar a origem das regras e a estatística comparada mede o grau de autoridade relativa dessas regras nas consciências individuais, chegando a responder à questão: por que a autoridade dessas regras variam?

            Considerando aqui que os fatos morais englobam os jurídicos, o pensador francês afirma que essas regras de moral universal se dividem em dois grupos: as que se referem às relações de cada um consigo mesmo, a denominada individual, que têm a função de fixar na consciência do indivíduo as bases fundamentais e gerais de toda moral; e as regras que determinam os deveres que os homens e mulheres têm uns com relação aos outros. Estas últimas são o ápice da ética, seu ponto mais elevado.

            A sanção é uma consequência do ato, “porém uma consequência que resulta não do ato tomado em si mesmo, mas daquilo que está ou não de acordo com uma regra de conduta preestabelecida” (idem). É a anterioridade da regra que legitima a sanção.

            Para Aristóteles, a moral varia com os agentes que a praticam, por isso a sanção, em sua dimensão individual, é relativa quanto ao aspecto preventivo, incidindo de forma mais densa e eficaz na consciência daqueles que a tomam por mais “autoridade”.

             A regra interiorizada tem maior aderência nos atos daqueles que a apreenderam em ambiente propício à maior reflexão e consciência crítica. Alguns somente a subvertem.

            A produção de verdade sobre si próprio só é possível por quem assim se disponha, se disponha a conhecer-se. E pra isso exige-se ambiente propício e seriedade de propósito. Como alcançar tal ponto reflexivo quando os exemplos de cima são de aviltamento da condição humana do outro? Numa quadra polarizada entre o seu e o meu não há saída possível, posto o seu ser sempre pior que o meu. Nessa lógica social e política o que sobra é o descompasso com a verdade, imperando a maledicência, a corrupção de valores e a mentira.

            Sem uma elite política e intelectual sólidas, as bases necessárias do devir hegeliano, do ser e o não ser, que passaria pelo conflito para o reconhecimento do todo, se finda num universo de hipocrisia social, de aceitação fluídica, em que a indiferença é o resultado do cansaço argumentativo e de postura dos que já foram extraordinários. Onde estão?  

            Confundir suposições com indícios e estes com provas não pode ser linguajar adequado aos altos escalões de uma República, assim como o Direito como ciência não pode sair dos estreitos limites traçados pela objetividade.

            A complexidade irredutível é princípio de autonomia científica. Se algo for reduzível a alguma outra coisa não pode ser pelo atributo da diferença, seria paradoxal. A Política e o Direito devem reger-se pela autoridade dos fatos morais, vale dizer, da física dos costumes universalmente aceitos e praticados.

            A tudo isso, a autocensura e autocrítica são necessárias. Mais fáceis àqueles que têm na autoridade da moral eficácia e legitimidade sancionadora. Reconstruir-se no devir, conflitando consigo e emparedando os desejos, eis uma saída inteligente para os que se viram nas amarras da vaidade.

            A sociedade, nas palavras de Durkheim, é uma aventura humana; o homem na sociedade equivale à sociedade no homem.

Para Platão, a Filosofia não se separa da Política, nem esta da moral. A sanção causada por atos desabonadores deve servir como expiação e não como pérola que se conta nas rodas de finais de semana.

É por aí...

 

Gonçalo Antunes de Barros Neto é magistrado e tem formação em Filosofia (email: bedelho.filosofico@gmail.com).     



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