• Cuiabá, 21 de Novembro - 00:00:00

Agro: ciclo longo ou bolha?

A partir de 2010, a agropecuária de Mato Grosso vive a sua melhor década de todos os tempos. O setor passou por dois grandes sustos. O primeiro foi em 2005 quando passou por grave crise financeira originada na baixa liquidez dos produtores, elevado endividamento bancário, queda de preços agrícolas e demanda reprimida.

O segundo susto veio com a crise financeira americana de 2008, que se transformou em crise mundial. O agro sofreu, como todos os demais setores produtivos, com a drástica redução da oferta de crédito, consequente paralisação da circulação de capitais e queda brusca da atividade econômica global.

A retomada do crescimento veio a partir da safra 2010 quando os preços internacionais retornaram a patamares remuneratórios históricos, o consumo mundial pegou tração novamente, e, puxadas pelas compras da China, as exportações de commodities agrícolas foram turbinadas.

O agronegócio do estado passou a viver sua década de ouro (2011-2020), ao contrário da economia brasileira que viveu, no mesmo período, sua pior década, a qual alcunhei nesta coluna de “A Década Perdida”, com crescimento médio anual de 1,24%. Dessa década dourada do agro, 2020 foi o melhor ano. Safra recorde, preços internacionais e nacionais explodiram e o consumo de alimentos aumentou.

O setor teve expressivo aumento da rentabilidade, atingindo margens de EBITDA acima de 30%. Vetores macroeconômicos como taxa real de juros baixa e a desvalorização cambial estimularam aumento do investimento agrícola em inovação tecnológica, modernização de equipamentos e terras.

O ciclo de alta de preços e consumo das commodities agropecuárias foi tão intenso que economistas e analistas passaram a discutir se o país e Mato Grosso não estão vivendo uma “bolha agropecuária” que, como todas as bolhas já conhecidas, pode estourar logo adiante por falta de consistência e sustentabilidade econômica.

Não vejo dessa forma. Partilho do pensamento que o novo ciclo das commodities agropecuárias será longo e continuado, alavancado pelo consumo doméstico e global, melhorias na logística com a chegada de novas ferrovias, privatizações de aeroportos e rodovias, ampliação da utilização de alta tecnologia na produção agropecuária e implantação da internet 5G.

A pandemia do coronavírus, no primeiro semestre de 2020, trouxe o temor que os movimentos de lockdown e redução do crescimento econômico provocasse uma queda drástica no consumo e nos preços das mercadorias agrícolas, que possuem peso decisivo no desempenho da economia do estado.

Decorridos os primeiros meses da pandemia, notamos exatamente o contrário. Gêneros alimentícios, assim como minério de ferro e metais utilizados na indústria da infraestrutura e eletroeletrônica experimentaram surpreendente valorização. Após um período recessivo num mundo que aprendia como lidar com a letalidade da pandemia, o consumo por mercadorias de origem agropecuária aumentou.

Esse movimento é explicado pela rápida retomada da economia chinesa e outros países asiáticos e pelos pacotes de auxílios implantados pelas principais economias do mundo desenvolvido e emergente para socorrer a renda dos mais fragilizados, proteger empregos e manter vivas as empresas. Essas medidas mantiveram aquecido o mercado internacional para as mercadorias agrícolas.

Além disso, os estoques internacionais de commodities agropecuárias encontravam-se em níveis muito baixos. Diante das incertezas sobre o tempo que poderia perdurar a crise sanitária, os países aumentaram suas importações para recompor estoques estratégicos e garantir segurança alimentar às suas populações.

Escancarou-se uma janela de oportunidade para regiões produtoras e exportadoras de grãos e carnes (suínos, frango, bovina), como é o caso de Mato Grosso. A demanda continuou aquecida na medida que as economias desenvolvidas avançaram na vacinação em massa e suas economias voltaram a crescer no início de 2021. As exportações do agro brasileiro devem atingir R$ 120 bilhões e de Mato Grosso deve superar, pela primeira vez, R$ 22 bilhões.

Esse “alinhamento de astros” deve perdurar com a recuperação do crescimento da economia brasileira e global, estabelecendo as condições para continuar aquecida a demanda mundial e local por produtos de origem agropecuária e toda a sua longa cadeia produtiva.

 

Vivaldo Lopes é economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia.  É pós-graduado em  MBA- Gestão Financeira Empresarial pela FIA/USP  (vivaldo@uol.com.br).



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