• Cuiabá, 21 de Novembro - 00:00:00

Corpos não mentem

  • Artigo por Gonçalo Antunes de Barros Neto
  • 10/02/2021 08:02:13
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A formação da subjetividade dos magistrados, assim como as demais profissões, depende de um ‘ethos desmercantilizado’. Ademais, o recorte feito por Molinier (2008), de uma posição ‘generificada’ e ‘racializada’, se faz presente na medida em que as mulheres, independentemente da posição social que ocupam, estão reféns de uma cultura misógina.

Os corpos sentem e ressentem as tarefas diárias. Um ano de magistratura faz a diferença. A construção de uma ‘Política de Sensibilidade’ no Poder Judiciário inclui desconstrução de mecanismos de poder já instaurados há tempos, como assinala Foucault ‘in’ Vigiar e Punir. As preocupações desses atores sociais não podem, e nem devem, pender para inclinações e impulsos afagado por entusiasmos, desaguando em superficialidades.

O desnude ao preconceito fornece argumentos e retóricas maiores que a empatia: compaixão. Aquele e aquela que não consegue sentir, se colocar na posição do outro, não está apto (ou apta) ao ofício. Sentir experiências alheias não significa se doer e influenciar por elas, mas entender, enxergar.

‘O exame de consciência é a ferramenta de que o juiz não pode abrir mão. A cada momento, precisa indagar a si mesmo a respeito das razões que o conduzem a decidir de tal ou qual maneira. Quais as alternativas abertas pelo caso concreto? A situações é clara, irretorquível, insuscetível de outras soluções? Qual a consequência de sua decisão para as partes e para o ambiente em que ela vai repercutir?’ (José Renato Nalini, em “Ética na Magistratura”, Editora Revista dos Tribunais, págs. 77/78). Corpos que julgam e são julgados.

Como assinala Le Breton (2006), o corpo é vetor semântico pelo qual a evidência da relação do mundo é construída, ou seja, as experiências que os seres vivenciam são sentidas, primeiro, no físico, no corpo, e dependem disso para entender o contexto de mundo experimentado. É através do corpo que o indivíduo se adequa à sua vida e, diante disso, pode traduzir sua subjetividade para o outro (Le Breton, 2006).

Portanto, é possível traçar paralelo do estudo da Sociologia do Corpo com o cotidiano dos magistrados e magistradas: o papel de julgamento da lide de outrem depende diretamente da experiência do corpo de quem o exerce. Os seres ali inseridos em uma sala de audiência devem estar em conformidade, e isso varia na medida em que o juiz ou juíza está saudável física e mentalmente. Os problemas particulares e ideológicos em casa devem ficar.

 A construção da subjetividade individual está associada com o físico, tomando como perspectiva o contexto social e político vivido, além de reproduções sociais. A práxis do magistrado envolve necessidade de sintonia com os demais presentes naquela sala no tocante às emoções e razões.

De acordo com Scribano (2012), retomar as sensações para escutar múltiplas vozes é um exercício indispensável. Por certo, se o magistrado (a) não se encontrar com a consciência preparada e saudável para as adversidades a surgir, não estará apto à apreciação dos conflitos.

Enfim, A idealização da verdade, ouvindo os dois lados opostos, é influenciada pela coerência do binômio corpo-mente.

É por aí...

 

Gonçalo Antunes de Barros Neto tem formação em Filosofia e Direito, sendo autor da página Bedelho. Filosófico no face e instagram e escreve em A Gazeta aos domingos.



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