Kamila Garcia
Há momentos na vida em que nos percebemos diante de limites internos — pequenas fronteiras emocionais, dúvidas e impasses que, embora invisíveis, são capazes de nos paralisar. Não se trata de um precipício físico, mas de um espaço íntimo onde decisões importantes se formam. Muitas vezes, permanecemos ali, observando possibilidades, avaliando riscos, tentando compreender o próximo passo.
A rotina, por vezes, nos faz esquecer que tudo é provisório. Não sabemos como um dia termina, nem quando mudanças definitivas acontecem. A existência se equilibra entre planos e imprevistos. Diante disso, a única realidade verdadeiramente disponível é o presente — o instante em que escolhemos, agimos e sustentamos nossos próprios movimentos.
Nessa travessia, a mente desempenha papel decisivo. Ela pode ser ferramenta de clareza ou fonte de inquietação. Quando se volta contra nós, amplia dúvidas, intensifica os medos e transforma pequenos desafios em grandes obstáculos. É nesse ponto que muitos de nós permanecemos imóveis: à beira do próprio pensamento, receosos de cenários que nem chegaram a existir.
Ainda assim, pensar é necessário. É o que nos permite interpretar experiências, organizar sentimentos e construir significados. Revisitar nossas incertezas não deve ser um convite à queda, mas uma oportunidade para compreender o terreno interno que pisamos. Conhecer o precipício é o primeiro passo para atravessá-lo.
Cada pessoa carrega seus próprios pontos de fragilidade: dores guardadas, arrependimentos silenciosos, medos que raramente são compartilhados. Reconhecê-los não nos enfraquece. Ao contrário, permite distinguir o que precisa ser ressignificado do que já pode ser deixado para trás.
As decisões diárias — desde palavras escolhidas até caminhos de vida — são os movimentos que nos aproximam ou nos afastam de nós mesmos. Não se trata de saltar no desconhecido, mas de construir percursos seguros, ainda que graduais. Resiliência, aqui, não é resistência rígida, mas capacidade de adaptar-se, reorganizar-se e seguir.
Somos, em alguma medida, arquitetos de nossas próprias pontes internas. Ao compreender nossos medos, transformamos o precipício que antes nos ameaçava em parte da paisagem da vida. Ele permanece lá, como memória e aprendizado, mas já não nos domina.
No fim, a travessia é contínua. Seguimos caminhando, reconhecendo limites, ampliando horizontes e consolidando terreno. E é assim que, aos poucos, aprendemos que é possível avançar — sem cair.
*Kamila Garcia é bacharel em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira, com pós-graduação em Psicanálise. Atualmente é estudante de Psicologia.


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