Márcio Coimbra
A cúpula dos BRICS, sediada no Rio de Janeiro, deveria ser o grande trunfo diplomático de Lula em 2025. Porém, ao contrário, o encontro se transformou em um constrangedor retrato do desprestígio internacional do presidente brasileiro. O que deveria ser um palco para reafirmar sua liderança, se tornará um festival de ausências — e não por acaso. A lista de chefes de Estado que já declinaram é longa, e as razões são reveladoras.
A mais significativa é a de Xi Jinping. Até recentemente tratado como parceiro prioritário pelo Planalto, o líder chinês optou por não viajar ao Rio. Sua ausência é um recado claro e expressa, entre outras coisas, o descontentamento diante da decisão do governo brasileiro em deixar de aderir formalmente à Iniciativa da Nova Rota da Seda — eixo central da projeção geopolítica de Xi. Ao optar por tornar o Brasil apenas um parceiro preferencial, Lula gerou desconforto e desconfiança nos líderes orientais.
Além disso, recentemente Pequim flexibilizou a entrada de turistas brasileiros em seu território como um gesto de aproximação. O Brasil, contudo, decidiu manter exigências e burocracia para cidadãos chineses. Na diplomacia, reciprocidade é fundamento. Na política externa, é preciso ler nas entrelinhas dos pequenos gestos e os chineses entenderam o recado. E não gostaram.
Entretanto, talvez o episódio mais incômodo tenha ocorrido no plano simbólico. Durante o jantar de Estado em Pequim, a primeira-dama Janja quebrou o protocolo ao se dirigir diretamente a Xi Jinping e, de forma inusitada, aproveitou a oportunidade para criticar o TikTok. A intervenção foi considerada desrespeitosa e causou visível desconforto à primeira-dama chinesa, Peng Liyuan. No universo altamente codificado da política oriental, esse tipo de atitude é lido como desconsideração pessoal e diplomática. Foi o empurrão final para a decisão de Xi de se manter distante do Rio. Isto significa que não estamos falando apenas de um desencontro de agendas, mas o sintoma de um desgaste latente que a retórica oficial tenta maquiar.
Do lado russo, a situação tampouco é confortável. Vladimir Putin, temendo a aplicação do mandado de prisão expedido pelo Tribunal Penal Internacional, avalia que Lula não tem condições políticas nem jurídicas de garantir sua segurança no Brasil. A promessa vaga de que não haveria prisão não convenceu o Kremlin. Outros líderes, como Abdel Fattah al-Sisi (Egito), Recep Erdo?an (Turquia) e Claudia Sheinbaum (México), também já sinalizaram que não comparecerão. O esvaziamento do evento se dá em todas as direções — das poucas democracias pragmáticas, onde seu discurso é visto com desconfiança, aos muitos regimes autoritários, onde sua liderança já é considerada ineficaz. Lula acabará isolado no palco que sonhava ocupar com pompa.
O que se constata é que Lula não possui o prestígio internacional que acredita ostentar. Se, em mandatos anteriores, sua retórica encantava plateias estrangeiras, hoje ela soa cansada e desconectada. O desprestígio que antes se intuía, tornou-se fato consumado. E a reunião dos BRICS no Rio promete ser o cenário definitivo onde se confirmará que a política externa brasileira, sob Lula, perdeu relevância — até entre seus aliados naturais.
Entre o discurso de grandeza e a prática diplomática há um fosso. E nele, afunda o Brasil — sem plateia, sem aliados e, cada vez mais, sem relevância.
*Márcio Coimbra é CEO da Casa Política e Presidente-Executivo do Instituto Monitor da Democracia. Conselheiro da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig). Cientista Político, mestre em Ação Política pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil e do Senado Federal.
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