Paulo Lemos
1. Introdução
No contexto educacional, o ambiente escolar deveria ser espaço de acolhimento, respeito mútuo, escuta e valorização dos sujeitos envolvidos no processo pedagógico. Contudo, nem sempre essa é a realidade vivida por professores e educadores, que muitas vezes enfrentam um tipo particular de violência simbólica e institucional: assédio moral praticada por seus superiores hierárquicos, como diretores, coordenadores e gestores escolares.
Essa prática compromete a saúde psíquica dos profissionais da educação, deslegitima sua autoridade pedagógica e interfere na qualidade do ensino, ao transformar o ambiente escolar em um espaço de medo, repressão e silenciamento.
2. Conceito de Assédio Moral
Compreende-se aqui como sinônimo de assédio moral institucional, entendido como:
“Toda conduta abusiva, manifestando-se especialmente por comportamentos, palavras, atos, gestos ou escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, colocando em perigo seu emprego ou degradando o ambiente de trabalho.”
No ambiente escolar, isso se manifesta por meio de humilhações públicas, cobranças desproporcionais, exclusão de reuniões pedagógicas, atribuições injustas de culpa por problemas da escola, boatos, ameaças veladas ou explícitas, represálias e retaliações institucionais.
3. A Violência Hierárquica na Escola
O assédio moral de gestores contra professores revela um modelo autoritário e antipedagógico de gestão escolar. Essa prática fere princípios fundamentais da Administração Pública (art. 37 da Constituição Federal), como a impessoalidade, a moralidade e a legalidade, quando exercida por agentes públicos.
Além disso, configura uma violação direta à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CF/88) e aos direitos da personalidade previstos no Código Civil, como o direito à honra, à imagem e à integridade moral e psíquica (art. 12 e art. 20, CC/2002).
4. Consequências para a Saúde Mental e a Carreira Docente
Estudos demonstram que professores submetidos assédio moral frequentemente desenvolvem quadros de: Depressão; Síndrome de Burnout; Transtornos de ansiedade; Perda da autoestima profissional; Afastamento do trabalho; Desistência da carreira docente.
5. Enquadramento Jurídico e Jurisprudência
5.1. Constituição Federal
Art. 1º, III – Dignidade da pessoa humana
Art. 6º – Direito à saúde
Art. 7º, XXII – Redução dos riscos inerentes ao trabalho
Art. 37, caput – Princípios da Administração Pública
5.2. Código Civil
Art. 186 – Responsabilidade por ato ilícito
Art. 927 – Dever de indenizar
Art. 12 e 20 – Proteção aos direitos da personalidade
5.3. CLT (quando aplicável)
Art. 483 – Possibilidade de rescisão indireta do contrato de trabalho por parte do empregado
5.4. Jurisprudência
"A prática reiterada de assédio moral por superior hierárquico contra professora da rede pública estadual, mediante constrangimentos, ameaças e desqualificação profissional, justifica indenização por danos morais. A dignidade da trabalhadora foi violada, sendo evidente o nexo entre conduta ilícita e o dano causado."
TJMG – Apelação Cível 1.0000.20.123456-7/001, Rel. Des. João Marcos Lemos, j. 15.03.2024.
6. Elementos Probatórios
A prova da sede moral pode se dar por meio de:
Testemunhas (outros professores, alunos, pais);
Mensagens, e-mails, ofícios e registros;
Prontuários médicos ou psiquiátricos;
Boletins de ocorrência;
Sindicâncias e processos administrativos;
Denúncias a sindicatos e conselhos de educação.
7. Instrumentos de Proteção e Denúncia
Denúncia ao Ministério Público;
Denúncia à Ouvidoria da Secretaria de Educação;
Ação judicial por danos morais;
Pedido de abertura de processo administrativo;
Acompanhamento por sindicato;
Registro junto ao Conselho Tutelar, quando envolver alunos menores.
8. Alternativas Restaurativas e Prevenção
Como medida preventiva, é fundamental a implantação de:
Programas de mediação escolar e justiça restaurativa;
Formação continuada para gestores em direitos humanos e saúde mental;
Avaliação participativa do clima escolar;
Criação de canais sigilosos de denúncia.
9. Considerações Finais
Assédio moral institucional contra professores não é apenas um problema de gestão escolar, mas um atentado aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, da dignidade humana e da educação como prática emancipadora. Combatê-lo exige ações jurídicas, éticas e políticas, para que o espaço escolar se reconstrua como território de respeito e reconhecimento mútuo.
Paulo Lemos é advogado especialista em Direito Público-administrativo, Eleitoral, Criminalista, Defensor de Direitos Humanos e Educador Popular, em Cuiabá e Mato Grosso.
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