Rafaela Maximiano
A economia criativa em Mato Grosso está ganhando destaque. Segundo dados do Sebrae/MT, o setor é responsável por 1,2% do PIB de Mato Grosso, o que representa cerca de R$ 200 milhões anuais.
Sobre o assunto o FocoCidade conversou com Sara de Paula, analista técnica em economia criativa na Gerência de Desenvolvimento Territorial do Sebrae.
A Entrevista da Semana explora a definição da economia criativa, seus benefícios econômicos e culturais, desafios enfrentados pelos empreendedores, serviços oferecidos pelo Sebrae e as tendências emergentes nesse campo. Além disso, destacamos o caso inspirador de Medellín, na Colômbia, que se transformou em um centro criativo.
A especialista ainda pontua que a economia criativa é uma área que envolve 56 setores entre eles, arquitetura, publicidade, gastronomia, audiovisual, música, artesanato, artes cênicas e visuais, entre outros.
Boa leitura!
Como você define a economia criativa e quais setores ou atividades ela abrange?
A ideia da economia criativa é tudo aquilo que você empreende a partir da sua criatividade. Então, quando a gente fala desse conceito muito aberto, acaba ficando um pouco vago. Então como assim a gente empreende a partir da criatividade? Se a gente for pensar, por exemplo, em um arquiteto. Ele tem o trabalho de fazer o projeto, de fazer todo aquele desenho, só que todo aquele processo criativo, ele tá na mente dele ele consegue externalizar essa criatividade por meio de um projeto, por meio daquela entrega. Então a arquitetura, por exemplo, é um dos segmentos que fazem parte da economia criativa, porque ele empreende a partir daquela criatividade.
O publicitário, por exemplo, ele é um profissional que vai criar, desenvolver campanhas, peças, design gráfico, enfim. Todo aquele material que ele te entrega no final daquele processo é o final de um processo criativo. Ele teve que empreender a sua criatividade dentro daquele processo para poder te entregar esse material publicitário. Então todo aquele profissional que empreende a partir dessa criatividade, é um profissional de economia criativa.
Se a gente for entrar em gastronomia, por exemplo, a gastronomia diferenciada ligada à cultura que traz uma memória de um local. Ela também é economia criativa porque ela tem esse vínculo com a cultura. Quando a gente fala da cultura de um local, a gente não fala só de danças ou músicas ou vestimentas. A gente fala também da culinária. Ela está associada à cultura do local. Então quando a culinária, a gastronomia, ela está associada a esse vínculo cultural, como, por exemplo, a farofa de banana, a paçoca de pilão, aqui pra nós de Cuiabá, ela também é um produto de economia criativa.
A economia criativa compreende também essa parte cultural. A parte de danças e expressões culturais também é compreendida como uma área de segmento de economia criativa, assim como também as artes visuais, artes plásticas, todas essas expressões artísticas e culturais, elas também estão dentro do segmento de economia criativa. A parte de moda, que tem aquele viés da criatividade, do desenvolvimento daquela vestimenta, então isso também é economia criativa. São vários segmentos, mais de 12 segmentos dentro da economia criativa. E a linha de raciocínio geral são essas duas: primeiro, esse vínculo com a cultura e também é a questão de empreender a partir da criatividade.
Quais são os principais benefícios econômicos e culturais da economia criativa em uma região?
A economia criativa em uma região, onde ela não é vista como economia é muito interessante. Porque hoje um dos maiores desafios que nós encontramos aqui no Sebrae quando a gente vai se relacionar com o segmento de economia criativa é justamente o empreendedor se enxergar como empreendedor. Muitas vezes aquele artesão fala que ele faz por hobby e não vê naquilo uma fonte de renda. Ele faz por amor, ele faz porque ele gosta. Então, é um processo de muito diálogo, dessa construção coletiva com os empreendedores para ele se enxergar como empreendedor, de se enxergar como um processo criativo que pode ser rentável para ele.
É engraçado como a economia criativa está vinculada ao aspecto de uma forma muito profunda no sentido desse amor pelo que faz. E aí, quando a gente traz economia criativa para um cenário real é muito gratificante potencializar esse olhar de empreendedor, desses criativos que já fazem coisas incríveis e às vezes falta um pouco desse olhar de marketing, um olhar de venda, um olhar de entrega. Temos várias pesquisas do Itaú Cultural que comprovam que a economia criativa traz o empoderamento das pessoas, traz um propósito para algo rentável que vai realmente ser o sustento daquela família. Então, é muito interessante o potencial da economia criativa num local onde ainda não foi implementado, quando você começa a construir coletivamente essa economia é muito gratificante.
Quais são os desafios comuns enfrentados pelos empreendedores criativos ao iniciar e manter seus negócios, principalmente aqui em Mato Grosso?
Uma das coisas que a gente identificou nessas vivências aqui em Mato Grosso é a questão da informalidade que traz alguns prejuízos, digamos assim, para os empreendedores no sentido principalmente de oportunidades que ele não consegue acessar. Hoje nós temos muitas leis de incentivo como a Lei Paulo Gustavo, a Lei Aldir Blanc, nós temos editais de grandes empresas que têm o propósito também de fomentar a cultura e o empreendedorismo cultural em espaços aqui do Mato Grosso, seja ele rural ou urbano, associações culturais, enfim, esses grupos podem acessar esses editais e essas leis de incentivo com projetos somente se eles forem formalizados, somente se eles tiverem todos os documentos em dia, essa formalidade é muito importante.
Um dos desafios, principalmente para os empreendedores desse segmento, é acessar esses conhecimentos acerca da formalidade. Se ele for MEI, ele tem que ter todos os desdobramentos do MEI, se ele for uma associação cultural, ele tem que ter todos os desdobramentos de uma associação. E, acaba sendo um desafio que o SEBRAE se propõe a caminhar junto, porque é o propósito do SEBRAE ser a força do empreendedor brasileiro.
Então, algo que a gente tem realmente contribuído é muito nessa parte de identificar quais são os desafios da formalização, porquê ele não se formalizou até agora, entender realmente, porque muitas vezes tem outros motivos, que a gente, às vezes, daqui não consegue enxergar, e só ouvindo o cliente que a gente consegue ver. Às vezes, também, há algumas dificuldades acerca principalmente de pleitear esses projetos de grandes empresas e editais de leis de incentivo pois é preciso elaborar um projeto, além da formalização, além de ter todos os documentos, é preciso elaborar um projeto, esse projeto tem que estar externalizando todas essas informações que ele quer, que aquele projeto pede.
Nesse aspecto o SEBRAE tem contribuído bastante, nós estamos com uma consultoria acompanhando realmente, seis empresários do segmento de economia criativa e a gente está fazendo todo o processo com eles, desde a captação de recursos, de pensar esse projeto criativo, em como ele vai captar recursos, para ele ter a sua sobrevivência garantida, até a prestação de contas, porque uma vez que você é contemplado pelas leis dos editais, leis de incentivo, você tem que prestar conta daquele recurso que você recebeu.
Então, o desafio não acaba depois que você consegue o recurso, também é necessário você prestar conta dele. É um processo que a gente identificou que ainda estava um pouco dificultoso para o empreendedor criativo, ele ainda estava tendo dificuldade em elaborar o projeto, para preencher esses editais, depois ele tinha dificuldade na prestação de contas, então nós conseguimos trazer uma especialista para fazer esse acompanhamento, foram beneficiados seis empresários nesse momento, mas lá na feira do empreendedor, nós vamos conseguir também dar essa consultoria de uma forma pocket, porque é um evento de quatro dias, mas essa mesma especialista que está acompanhando esses empreendedores agora, desde julho, ela vai estar conosco também no Estande de Economia Criativa do SEBRAE, lá na feira do empreendedor, para atender os empreendedores que se interessarem pelo assunto, que quiserem entender mais sobre prestação de contas, que quiserem entender mais sobre captação de recursos, enfim, para projetos culturais criativos, e esse atendimento vai ser gratuito para esses empresários que visitarem o nosso estande lá na feira do empreendedor.
Esse serviço de acompanhamento, consultoria é sempre gratuito pelo SEBRAE?
Hoje a gente fornece esse serviço gratuito, mas é limitado, para esse ano, eu não tenho mais limite para atender mais empreendedores. Eu tenho um limite de atendimento para atender esses empreendedores, um limite orçamentário para atender mais empreendedores nesse processo completo que eu te descrevi, desde a elaboração do projeto, captação de recursos, prestação de contas. Mas a orientação é gratuita e as pessoas podem fazer o agendamento pelo 0800 570 0800. Quanto mais empreendedores a gente tiver conseguindo dar o suporte melhor para nós também, é o nosso propósito realmente atender esses clientes. Então, acho que todo mundo ganha no final das contas.
Qual é o objetivo principal da 13ª Feira do Empreendedor do Sebrae/MT?
A Feira do Empreendedor é o maior evento de empreendedorismo de Mato Grosso. É o maior evento de empreendedorismo do sistema Sebrae também. Então, é algo que é replicado em todos os Sebraes do Brasil a cada dois anos. Vai ser um espaço realmente muito diverso, todos os segmentos do Sebrae estarão atuando dentro da Feira do Empreendedor, mas focando em economia criativa.
Nesse aspecto nós estamos com o edital aberto de showcases para bandas independentes se apresentarem e receberem feedbacks de profissionais que realizam festivais de música no Brasil. Teremos uma espécie de The Voice dentro da Feira do Empreendedor. Vão se apresentar três bandas por dia nesses quatro dias de evento. Nós teremos também o palco principal onde nós teremos dias temáticos que começam com regionalidades, vai para povos, ancestralidades e memórias, volta para regionalidade e finaliza com brasilidade. Teremos apresentações de dança da nossa cultura: siriri, rasqueado, lambadão. Nós teremos uma apresentação de balé clássico. Então, a gente realmente vai contar com uma diversidade muito grande na Feira do Empreendedor. O nosso estande funcionará durante todo o tempo do evento, desde às 14h até às 22h, com várias consultorias focadas em economia criativa.
Um diferencial também que a gente vai ter nesse campo das consultorias, é a consultoria de ESG para criativos. ESG é um conceito que vem da área de sustentabilidade, olhando principalmente para investimento de empresas que estão lá na Bolsa de Valores Internacional, principalmente. Porque de lá os investidores cobram essas posturas de sustentabilidade das nossas grandes empresas. Consequentemente, a nossa grande, que tem na cadeia de valor os pequenos negócios, que são o espaço de atendimento do Sebrae, elas também passam a exigir dos pequenos negócios esses critérios de sustentabilidade, até para não se depararem com situações como a gente se deparou há dois meses, se a gente falar daquela vinícola, por exemplo, dentro da cadeia de valor dela, ela tinha ali o trabalho análogo à escravidão, a gente já teve algumas lojas grandes de roupa que tiveram também essas mesmas situações de trabalho análogo à escravidão. Por quê? Porque elas não olhavam para a sua cadeia de valor. Eu só estou comprando do meu terceiro e estou vendendo. Mas agora, por conta de várias situações, há essa preocupação desses investidores internacionais com toda a cadeia de valor daquele negócio que eles estão investindo. E essas grandes, tendo em sua cadeia de valor os pequenos negócios, elas passam a exigir dos pequenos negócios também todos esses critérios de ambiental, social e governança, que é a sigla ESG.
Mas como é que o ESG, por exemplo ou demais critérios ambientais, impactam o pequeno negócio de economia criativa?
O pequeno negócio de economia criativa às vezes tem uma porta muito ampla na parte de captação de recursos. Ele pode olhar para editais, ele pode olhar para várias coisas. E uma das coisas que ele pode se preparar para adentrar é essa parte desses investimentos dessas grandes empresas. Porque elas têm ali um recurso destinado para esse tipo de iniciativa, só que elas não podem simplesmente entregar os recursos sem que o pequeno negócio apresente todos os seus critérios, do porquê que ela é elegível, tem que evidenciar como é que ela atende aquela comunidade e todos esses critérios estão ali dentro da governança do ESG. Então hoje temos esse processo da consultoria ESG para criativos que também vai estar disponibilizado lá na feira do empreendedor.
Quais são as tendências emergentes na economia criativa que os empreendedores devem acompanhar?
Eu colocaria o ESG nessa questão. Principalmente porque é uma oportunidade para que eles se diferenciem e busquem uma outra fonte. Mas com uma tendência potencial.
Quais são os exemplos de casos de sucesso na economia criativa que você considera inspiradores?
Posso citar uma missão técnica que a gente fez recentemente lá para a Colômbia, país que sempre esteve associado ao tráfico, ao consumo de drogas. E quando se fala de Medellín a primeira coisa que você associa é essa questão de drogas, números altos de mortalidade, quase um cenário de guerra.
Contudo, houve todo um estudo, um investimento focado em economia criativa e em inovação dentro daquele espaço. O que transformou Medellín na cidade mais criativa do mundo. Ela se tornou realmente um laboratório de economia criativa. A missão técnica aconteceu agora no mês de agosto e técnicos do SEBRAE vivenciaram todas essas experiências que a Colômbia conseguiu trazer por meio de distritos criativos, transformando espaços tidos como cenários de guerra em um distrito criativo. Um espaço colaborativo de inovação que mostra o potencial transformador da economia criativa. Vale a pena pesquisar sobre o assunto.
Considerações finais...
Eu gostaria de reforçar o convite para todos os empreendedores participarem da Feira do Empreendedor. Tanto os de economia criativa e os não, porque realmente vai ser um espaço que vai conseguir trazer muitos aprendizados para quem se fizer presente. Principalmente, que vai potencializar esse acesso à palestrantes de renome, a consultorias, a vivências culturais. Tudo isso em formato gratuito. Será no Centro de Eventos do Pantanal, de 5 a 8 de outubro, das 14h às 22 horas.
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