Rafaela Maximiano
“A proposta da atual Reforma Tributária não necessariamente vai incentivar o empreendedorismo”. A afirmação é do advogado Rodolfo Tamanaha que é professor de direito da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília (FPMB).
Para o especialista, falta “simplificação e transparência”, pontos que realmente ajudariam o empreendedor e pequenos empresários a se preocupar menos com as questões tributárias.
O tema empreendedorismo foi abordado na Entrevista da Semana chamando a atenção para os seguintes pontos: educação financeira, os desafios de se empreender no Brasil, criptomoedas e recuperação judicial.
Ao FocoCidade, Rodolfo Tamanaha, afirmou que a educação financeira deveria constar como obrigatório no currículo básico das crianças e dos adolescentes e abordar tópicos como direito do consumidor, e os riscos relacionados a fraudes e golpes no ambiente digital.
Professor Rodolfo Tamanaha é doutor em direito pela USP e sócio do Madrona Fialho Advogados.
Boa Leitura!
Qual a importância de incluir a educação financeira no currículo escolar? E, quais habilidades e conhecimentos básicos acredita que todos os alunos deveriam aprender sobre finanças pessoais?
A educação financeira é um conteúdo que deveria constar como obrigatório no currículo básico das crianças e dos adolescentes principalmente porque se eles pensassem nos pilares da educação financeira, ou seja, ensinássemos crianças, adolescentes e até adultos, como eles devem gerenciar os seus rendimentos e também a própria percepção de que – como na contabilidade – para cada débito tem que haver uma receita equivalente, inclusive um débito sempre abaixo da receita, nunca pode ser acima. E, se for acima, a pessoa deve buscar um tipo de financiamento para consumir algo no valor acima da renda que a pessoa tem atualmente. A educação financeira, nesse sentido de dar as noções básicas relacionadas ao que é ativo e passivo, à receita e despesa são fundamentais. E, a partir disso desenvolve na criança e no adolescente um consumo consciente para saber o que devemos buscar ou adquirir um produto com base no recurso que a pessoa tem e nas suas necessidades principalmente e se eventualmente aquele bem está acima da sua capacidade de pagamento, ou você opta por um produto ou serviço mais barato e que atenda a sua necessidade, ou a pessoa busca complementar a renda. Seja aguardando um tempo para juntar mais recursos e adquirir o produto ou serviço, ou ainda buscando um tipo de financiamento, que sabemos no Brasil a população brasileira ser pouco educada quanto aos financiamentos e por isso que estamos acostumados a pagar taxas altíssimas de juros de empréstimos junto aos bancos.
Existe uma discussão de fundos relacionada à dificuldade que esses bancos têm de recuperar os créditos que eles fornecem, isso também é um fator importante, pois a cada R$ 10 que eles emprestam apenas R$ 2 ou R$ 3 eles recuperam, ou seja de 2 a 3% é recuperada, e isso faz com que a taxa de empréstimo, de juros, seja altíssima. Mas essa é a realidade brasileira.
O Consumidor, a criança, o adolescente e o próprio adulto, tem que estar ciente dessa situação para saber que no momento que ele atrasa a parcela de um financiamento quais são os juros incidentes. Também precisam ter uma noção básica de direito do consumidor para saber que o banco irá cobrar taxas altas e tudo mais, porém ele tem que ser muito transparente ao explicar quais essas taxas aplicadas, as condições, ou seja, se a pessoa atrasa uma parcela se significa a rescisão do contrato ou não significa, se foi dado algum bem de garantia ou não foi dado, são elementos que integram na minha visão o papel da educação financeira.
Acho que no mundo atual por causa da tecnologia, essa educação financeira vai ter que incluir por exemplo, medidas de educação relacionadas a como prevenir fraudes e golpes. Porque com a tecnologia isso ficou muito mais presente. Na minha leitura, a educação financeira deveria despertar principalmente no adolescente e no adulto uma preocupação financeira sobre o cenário econômico. Como o Brasil está se organizando? Como o mundo está se organizando? O que está acontecendo; subindo preço do petróleo? O que faz subir o preço da gasolina impacta de que forma nas nossas vidas, ou seja, ter uma clareza e preocupação com o cenário financeiro e econômico mínimo que seja também é importante. É o início de uma preparação que vai se desenvolvendo ao longo do tempo. E, por último, acho que a educação financeira deveria focar na geração de receita.
Dados do Sebrae apontam que a maioria dos jovens não conseguem empregos assim que se formam. Quais são os principais desafios que os jovens enfrentam ao tentar empreender no Brasil?
Tem conexão com a educação financeira focar na geração de receita que eu disse anteriormente. Acho que temos empreendedor de dois tipos no Brasil: o empreendedor por necessidade e o empreendedor por natureza. O por necessidade não é necessariamente um empreendedor, a pessoa busca desenvolver algum tipo de necessidade principalmente porque ela não consegue um emprego. E, o empreendedor por natureza é a pessoa que decide avançar num certo mercado porque ela vê a oportunidade e têm condições de explorar essa oportunidade.
No contexto de uma educação financeira tem que se preocupar com esses dois tipos de empreendedor e essa educação deveria ter uma menção, um início de discussão de empreendimento de fato, ou seja, pegar conceitos básicos do empreendedor, principalmente do ambiente digital, que é um mundo particular e tem muito empreendedor digital no Brasil e são exatamente os adolescentes, os jovens, que desenvolvem startups do zero, tem muita gente que quer experimentar e gente que já está no mercado, e tem os novos que inclusive tem outras habilidades principalmente do ponto de vista do relacionamento. Por exemplo um empreendedor pode ser uma pessoa que consegue vender algum tipo de conteúdo por internet. Então acho que a educação financeira atual deveria dar conta de pelo menos apresentar esse universo de possibilidades, principalmente no ambiente digital, e os riscos relacionados a fraudes e golpes, e apresentar para o público jovem esse mundo de possibilidades que o mundo digital traz e tem a possibilidade de se destacar, produzir conteúdos digitais remunerados sem ter uma estrutura que no passado era necessário.
Recentemente vimos um episódio de várias pessoas que investiram em criptomoedas e perderam dinheiro. Em linhas gerais o que é a criptomoeda, quais são os riscos associados ao investimento em criptomoedas e como eles podem ser mitigados?
A respeito de criptoativos eu acho que as pessoas não devem considerar como investimentos. O criptoativo não é investimento, pode até ser um investimento, mas é de alto risco. As pessoas não sabem o beabá de segurança financeira quanto mais querer buscar um rendimento elevado com algum tipo de criptoativo. A pessoa, no contexto também de educação, precisa entender que existe hoje um marco regulatório dos criptoativos que agora o Bacen, o Banco Central do Brasil, o órgão público que vai regulamentar a atuação dessas exchanges que comercializam criptoativos também tem uma série de requisitos, de compliance, requisitos de combate a fraudes, de combate à corrupção, com parâmetros que essas doenças que querem atuar nesse setor vão ter que se adequar. Então acho que a pessoa tem que se informar mais, se educar sobre o que existe, em termos de regulamentação no Brasil que está ocorrendo agora para só depois avaliar se é o caso de investir.
No caso das criptomoedas é um mercado que tem muito vai e vem, é uma montanha russa e a pessoa precisa estar antenada, sabendo inclusive quais são seus direitos em relação por exemplo ao mercado de bitcoins, o que ela pode de fato requerer do ponto de vista de investidor com essas empresas. Atualmente ainda existe uma certa insegurança na própria separação do patrimônio dessas empresas, essa parece ser uma tendência que o Banco Central vai adotar de separar o patrimônio e dizendo “olha o patrimônio de investidores é uma coisa, o patrimônio da corretora é outra”, isso garante que não haja sobreposição e na hora que a pessoa tiver algum problema busque o dinheiro de uma finalidade distinta.
A loja Americanas foi manchete em todo o país por entrar em recuperação judicial, mas muitos brasileiros não compreenderam o que o ocorreu. Poderia explicar o que é recuperação judicial e a diferença de falência da empresa?
A recuperação judicial é basicamente um procedimento que visa promover uma reorganização das contas da pessoa jurídica, inclusive é um procedimento regulamentado e basicamente o que acontece: a própria empresa que solicita a recuperação judicial. E, ela apresenta no âmbito judicial, para o juiz específico que tem competência para avaliar esse tipo de demanda, um documento requerendo a recuperação judicial. Para isso ela vai apresentar desde os motivos, a documentação contábil dos últimos três anos, detalhamento de todo aspecto patrimonial, tanto da empresa quanto dos sócios para ver se não está tendo algum tipo de confusão do sócio usando recurso da empresa para fins particulares. É um procedimento que a empresa apresenta um plano de recuperação e o juiz dando início para o processo, ele designa um profissional que vai ajudá-lo, que é o auxiliar dele que junto com os sócios da empresa vai supervisionar para que a empresa volte a atuar, a vender produtos e serviços, para exatamente poder pagar os seus credores.
O grande benefício da recuperação é que ela faz com que as dívidas daquela empresa fiquem suspensas incialmente por 180 dias, para que depois elas entrem em um plano de pagamento que foi acordada com o juiz, junto com o administrador e logicamente que tem que ter uma maioria de 50% mais um dos credores que concordem com aquele plano de pagamento.
Já a falência, de forma simplificada, é um processo judicial por meio do qual é realizada a apuração e venda dos bens de uma empresa que não possui mais condições de arcar com a totalidade de suas dívidas. Depois disso, efetua-se o pagamento em favor daqueles cujos créditos dizem respeito – os credores. Então, diferente da falência a recuperação judicial visa exatamente permitir essa recuperação econômica da empresa.
A atual Reforma Tributária pode trazer um cenário melhor para se empreender no Brasil?
Eu penso o seguinte: essa Reforma Tributária não vou nem dizer se ela é negativa ou positiva, para o empreendedor. Uma reforma que trouxesse mais simplificação e transparência realmente ajudaria o empreendedor, para ele ter que se preocupar menos com as questões tributárias, mas o fato é que essa reforma tributária na minha visão está sendo pouco discutida e pouco transparente, você não tem um texto final para ser debatido em audiências públicas durante algum tempo. Você tem basicamente o parlamento fazendo reuniões privadas com entidades e tudo mais, tentando convencer sobre linhas gerais do que é a proposta de reforma para depois colocar isso para ser votado no plenário, à noite, sem qualquer tipo de escrutínio público. A proposta da atual Reforma Tributária não necessariamente vai incentivar o empreendedorismo.
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