
O I Encontro do Colégio de Coordenadores da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário Brasileiro (Cocevid), presidido pela desembargadora Maria Erotides Kneip, realizado em Cuiabá nos dias 26 e 27 deste mês, reunindo a maioria dos representantes dos Tribunais de Justiça dos estados, impulsionou uma nova dinâmica de atuação, que visa entre série de avanços propostos, a interligação de sistema de dados e experiências – sendo a meta promover um cenário de maior segurança à mulher.
É nesse contexto que o secretário do Cocevid, o juiz Álvaro Kalix Ferro, coordenador da área de violência doméstica do Estado de Rondônia, acentuou o alerta acerca da necessidade do compartilhamento de informações, mirando a ampliação de debates à consolidação do fortalecimento da rede de proteção à mulher, considerando números assustadores de casos de feminicídio no país.
Nesta Entrevista da Semana Especial ao FocoCidade, o juiz Álvaro Kalix ressalta a complexidade do tema, mas assevera a atenção à implementação de políticas públicas delineadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a convenção da ONU que trata da não discriminação, e a meta da ampliação de ações com participação de Poderes, órgãos, entidades e da sociedade, no desafio da ascensão da seara de enfrentamento à violência contra a mulher.
Breve histórico
O juiz de direito Álvaro Kalix Ferro - indicado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (TJ/RO), exerce o cargo de membro titular do TRE-RO/biênio 2019-2021.
Álvaro Kalix Ferro é natural de Cuiabá, nascido em 16 de fevereiro de 1968. Graduou-se como Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), em Cuiabá-MT, no ano de 1989.
Ingressou na carreira da magistratura, no Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia, em 1º de setembro de 1992. O magistrado foi juiz auxiliar da Corregedoria do Tribunal de Justiça de Rondônia entre 2010 e 2012; atuou como juiz auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça entre 2012 e 2013; exerceu o papel de juiz auxiliar da Presidência do Tribunal de Justiça de Rondônia entre 2016 e 2017 e atuou como juiz das zonas eleitorais em Guajará-Mirim, Cerejeiras, Ji-Paraná e Porto Velho.
Fundador e presidente do Fórum Nacional de Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher - Fonavid e membro do Movimento Permanente de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, Conselho Nacional de Justiça (2014).
Faz parte do Grupo de Trabalho para elaboração da Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher (Portaria nº 15/2017), Conselho Nacional de Justiça (2017). (Informações sobre o histórico conforme a Comunicação Social do TRE-RO)
Confira a entrevista:
O que se busca com o encontro?
Veja que as coordenarias, elas trabalham cada uma em seus estados. Cada Tribunal tem uma coordenadoria. É extremamente importante que a gente faça entre nós uma interlocução. Esse primeiro encontro vai propiciar exatamente isso além das palestras que vamos receber, fortalecimento sobre conteúdo teórico daquilo que nós temos sob convenção, a própria Lei Maria da Penha, nós vamos trabalhar esse entrelaçamento entre as coordenarias de modo que possamos saber o que tem sido feito por uma e por outra, de boa prática, nesse enfrentamento à violência contra a mulher, porque é um problema muito complexo. E cada estado, na sua peculiaridade, dentro da sua própria criatividade, os Tribunais têm desenvolvimento de políticas excelentes, tão importante que nós não sejamos ilhas, que a gente possa ter essa interlocução entre nós também e possamos juntos criar outras políticas, além daquelas que já existem, olhando para cada uma daquelas que estão sendo implementadas, mas também para aquilo que precisa ser feito.
A legislação merece alterações?
As vezes nos perguntam se a Lei Maria da Penha precisa ser modificada. Na verdade, ela precisa ser implementada no seu todo, na sua totalidade, na sua plenitude, tal qual as convenções de Belém do Pará, que trata da violência contra a mulher, a convenção da ONU que trata da não discriminação, da busca pela igualdade, então nós temos mecanismo legais, nós precisamos sim trabalhar mais a implementação desses mecanismos.
É importante que as mulheres denunciem, porque a ideia de impunidade também pode fazer com que se repita a violência.
A impressão as vezes é de que a Lei Maria da Penha que não tem surtido tanto efeito.
Veja bem, o que é importante frisar é que quando você especializa um serviço e faz um acolhimento melhor, um enfrentamento melhor a essa violência, a tendência é que as pessoas que são vítimas, as mulheres que são vítimas dessa violência, tenham mais desejo e melhor acolhimento a ponto de buscar ajuda. É importante frisar que muitas mulheres por vezes não denunciavam antes da Lei Maria da Penha, porque não tinham mecanismo de proteção tão forte. E além disso, a Lei Maria da Penha trouxe mecanismos importantes como a própria medida protetiva de urgência, com alguns outros mecanismos que são feitos em alguns estados como o botão do pânico, tornozeleira eletrônica, que fazem com que haja um melhor acompanhamento daquele que é o agressor. Então isso faz com que as mulheres busquem mais.
Há então um campo de aumento de denúncias em razão de mais instrumentos de enfrentamento?
Além disso a própria imprensa tem trabalhado bastante nisso, na divulgação de que é importante que as mulheres denunciem, porque a ideia de impunidade também pode fazer com que se repita a violência. E a violência, nós temos estudos de que ela é um ciclo, e esse ciclo quando não há uma busca por ajuda dessa mulher, a tendência que a gente tem visto nos nossos processos, é que haja uma piora naquela violência, uma força maior naquela violência, uma agressividade maior. Então é importante quando a gente fala dos números é que a gente lembre sempre, que quando se especializa há uma busca maior, e que hoje nós temos mais controle sobre os dados.
Que leitura faz sobre o contexto desses dados e resultados na prática.
Para se ter uma ideia, antes do feminicídio, tudo era tratado como um homicídio, então para se buscar um homicídio vamos dizer assim com uma vítima mulher. Os dados eram muito mais complexos. Hoje não. Hoje há uma facilidade maior na busca de dados, implementação de procedimentos eletrônicos de busca. O próprio Conselho Nacional de Justiça implementando uma central como tem sido feito, a Semana da Paz em Casa que tem sido trabalhada com mutirões. De tudo isso se presta contas, então é importante frisar também que os dados estão aparecendo, estão sendo mostrados mais, é bastante importante isso.
É necessário reforço na estrutura de Estado, considerando muitos questionamentos acerca do sistema de funcionamento da tornozeleira?
Não tenha dúvida que a interlocução entre os Poderes é prevista na própria Lei Maria da Penha. Essa interlocução é necessária entre os Poderes. Por exemplo, no que diz respeito às medidas protetivas de urgência, é preciso que se diga que haja uma implementação de mecanismos que possam facilitar o acompanhamento, a fiscalização dessas medidas. Nós temos algumas boas práticas pelos estados que são o botão do pânico. O próprio uso da tornozeleira eletrônica, patrulhas Maria da Penha da Polícia Militar, da própria polícia municipal. É importante que a gente possa discutir isso tudo porque há boas práticas pelo Brasil afora, para que a gente possa levar essa discussão aos nossos estados essas boas práticas, e também criar outras alternativas importantes para essa fiscalização, porque não há dúvida de que na Lei Maria da Penha um dos melhores mecanismos é exatamente a medida protetiva de urgência.
A fiscalização ainda é falha?
Nós ainda precisamos buscar outros meios para melhor fiscalizar. Para você ter uma ideia, no meu estado, em Porto Velho, que temos 500 mil habitantes, temos cerca de 2,5 mil mulheres sob o cuidado de medidas protetivas. O número de descumprimento dessas medidas, como acontece no Brasil afora, é pequeno, mas são riscos que a gente precisa tentar diminuir, trabalhando como? Buscando com o Executivo melhor sistemas para que a segurança pública possa oferecer melhores sistemas de fiscalização, de acompanhamento, como da tornozeleira por sistema de satélite, como a patrulha Maria da Penha.
A interlocução é a palavra.
Todos esses mecanismos são importantes e a nossa interlocução, do Judiciário com os demais Poderes, e não só com os demais Poderes, mas também com a sociedade civil organizada, com a sociedade como um todo é de extrema importância.
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