Lucas Rodrigues - Midianews
O Ministério Público Estadual (MPE) ingressou com uma ação civil pública contra o ex-governador Silval Barbosa e o deputado Adriano Silva (PSB) por diversas ilegalidades na aquisição da faculdade União de Ensino Superior de Diamantino Ltda (Uned), feita em 2013 pelo valor de R$ 7,7 milhões, sendo integrada à Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat).
Também foram acionados por improbidade administrativa o ex-secretário de Estado de Administração, Francisco Faiad, e seu ex-adjunto José Jesus Cordeiro; e o ex-reitor financeiro da Unemat, Ariel Lopes Torres.
A Uned foi criada pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e sua família, em Diamantino (187 km a Médio-Norte de Cuiabá).
A ação, a qual o MidiaNews teve acesso, foi assinada na última sexta-feira (22) pelo promotor de Justiça Daniel Balan Zappia, que pediu a condenação dos réus e o ressarcimento de R$ 10 milhões aos cofres públicos. O processo tramita na 1ª Vara Cível de Diamantino.
O promotor relatou que a faculdade privada Uned, na época da aquisição, contava com 898 alunos matriculados de 10 Municípios da região de Diamantino, 45 docentes e 24 funcionários realizando funções administrativas, sendo que o estabelecimento estava instalado numa área edificada de 5.631,50 m², “mobiliada e sediada num terreno de 16,4852 hectares”.
Em razão de dificuldades financeiras, os representantes da Uned procuraram o deputado e então reitor da Unemat, Adriano Silva, para tentar vender a unidade de ensino, integrando-a à Unemat.
Segundo o MPE, Adriano Silva concordou com a proposta e encaminhou o processo de aquisição da Uned à Secretaria de Estado de Administração, “mediante proposta formulada pela Uned do valor de R$ 8.150.000, dando causa à autuação do Protocolo nº 278438/2013, sob a gerência do Secretário Adjunto de Administração José de Jesus Nunes Cordeiro; que contava com a anuência do titular da pasta no período, Francisco Anis Faiad”.
Porém, antes mesmo que o processo de aquisição fosse concluído e as condições estipuladas pelo Conselho Universitário (Consuni) atendidas, Adriano Silva, no dia 9 de julho de 2013, editou a Resolução nº 24/2013 (fl. 458) autorizando a migração dos Cursos de Direito, Administração, Educação Física e Enfermagem da Uned para a Unemat de Diamantino.
“Somente em 22/07/2013, as instalações são finalmente avaliadas em R$ 7.769.816,89, pelo Laudo nº 119/2013/SAOP”.
Em setembro daquele ano, conforme o promotor, as instalações da Uned já começaram a ser encampadas pela Unemat, com a contratação precária de docentes e remoção de agentes universitários, “acompanhado do reconhecimento dos cursos superiores desenvolvidos, por migração, pelo presidente do Conselho Estadual de Educação”.
No mesmo mês, o então governador Silval Barbosa inaugurou, na companhia de Adriano Silva, o Campus de Diamantino da Unemat, “mediante a matrícula dos alunos da Uned sem a realização de vestibular e contando com um quadro precário de docentes”.
“Inclusive, os alunos então aprovados no exame promovido pela Uned no primeiro semestre de 2016, foram integrados aos quadros da Unemat . Ainda assim, os referidos réus foram ovacionados pela população que se fazia presente em tal solenidade, conforme registrou a imprensa regional. Contudo, as instalações e o imóvel ainda pertenciam à Uned, uma vez que somente após a emissão de relatório favorável da Comissão Especial da Unemat, foi realizada a compra e venda do edifício da UNED por R$ 7.700.000,00, por escritura pública lavrada no Livro nº 35, folha nº 193, assinada pelo reitor Adriano Aparecido da Silva”.
Sem planejamento
O promotor Daniel Zappia relatou que os recursos para a aquisição da Uned foram liberados pelo à época secretário de Estado de Administração, Francisco Faid, e pelo secretário-adjunto de Administração, José de Jesus Nunes Cordeiro.
“Posteriormente, tais recursos foram repassados à Unemat, a cargo da pró-reitoria de gestão financeira, chefiada por Ariel Lopes Torres”.
Conforme o MPE, Ariel Torres, na condição de ordenador de despesas da Unemat, deveria ter feito o planejamento financeiro da instituição para adquirir a Uned, o que não ocorreu.
“Contudo, em meio a ausência de qualquer estudo de impacto orçamentário, ou mesmo, financeiro, foi promovida a Ratificação de Dispensa de Licitação nº 007/2013 pelo reitor Adriano Aparecido Silva. Consequentemente, o referido pró-reitor de gestão financeira da Unemat autorizou a série de pagamentos para a Uned. Apenas em 13/11/2013, foi promovida a transcrição da compra e venda nas matrículas nº 37.384, 38.554, 38.553 e 30.645 do CRI/Diamantino-MT , promovendo-se a transferência do domínio do fundo de comércio da Uned para a Unemat. O pagamento de R$7.700.000,00 foi promovido entre 19/11/2013 e 25/06/2014 (fls. 410/431), pela Pró-reitoria de Gestão Financeira”.
O MPE relatou que, desde então, o campus de Diamantino na Unemat funcionou ininterruptamente, porém com um quadro de funcionários contratados precariamente, especialmente de professores.
“Como reconheceu o Pró-reitor Valter Danzer, o último concurso público realizado pela Unemat não previa a expansão para Diamantino-MT. Inclusive, nos contratos assinados pelo reitor Adriano Aparecido da Silva e Dionei José da Silva, em 2013 e 2014, consta como justificativa: “... abertura de novas vagas em decorrência da criação do Campus Universitário em Diamantino-MT, conforme Resolução nº 24/2013...”. Tal situação ainda é retratada no Ofício nº 184/2014-PRAD, de 27/02/2014. Ressalte-se que as queixas formuladas no período não se limitaram à precariedade do quadro funcional da referida unidade, pois compreenderam sua infraestrutura que, apesar de registrar algumas melhorias, pouco avançou no período, a considerar as instalações legadas pela Uned. Os reclamos de alunos, quanto a qualidade do ensino ministrado na referida unidade, persistem”.
Ilegalidades
Segundo o promotor, o Conselho Universitário da Unemat estipulou algumas condições para a efetivação da aquisição da Uned, entre elas a “aprovação e publicação de emenda a Constituição Estadual que defina o percentual de repasse orçamentário e financeiro para a Unemat” e “autorização imediata para a realização de concurso público docente”.
Todavia, nenhuma dessas condições foi observada durante a compra da Uned.
“Ao editar tal ato normativo unilateralmente – conforme esclarece o Ofício nº 37/2016-Assoc - o então reitor Adriano Aparecido Silva desautorizou o Conselho Universitário, ignorando as condições relacionadas no art. 3º da Resolução nº 001/2013- Consuni; esta aprovada pelo referido colegiado”.
“A iniciativa adotada pelo reitor Adriano Aparecido Silva, em conluio com os demais réus, em que pese tenha lhe trazido dividendos políticos, possibilitou que o processo de encampação da Uned pela Unemat fosse concluído, sem qualquer planejamento de ordem financeira. Ou seja, impossibilitou-se a estruturação de um quadro permanente de funcionários, sobretudo no que pertine aos docentes do Campus de Diamantino. Em suma, até a presente data, persiste o descumprimento da condição relacionada no inciso III do art. 3º da Resolução nº 001/2013-Consuni”.
O promotor Daniel Zappia também destacou a rapidez com que ocorreu todo o processo de aquisição da faculdade privada.
“Em 2013, num período de aproximadamente nove meses, por iniciativa do reitor Adriano Aparecido Silva, em conluio com os demais réus, foi deliberada, aprovada e operacionalizada a encampação da ‘UNED - União de Ensino Superior de Diamantino Ltda’, no município vizinho de Diamantino-MT. Já em setembro de 2013 a Unemat começava a gerir o seu novo Campus”.
“A celeridade conferida ao oneroso processo de expansão da ação governamental se revelou incompatível com o planejamento financeiro da Unemat, então a cargo do Pró-reitor Ariel Lopes Torres, uma vez que a Lei Orçamentária vigente em 2013 não previa a instalação do Campus de Diamantino”.
A ação ainda narrou que tampouco havia previsão em lei para a instalação da unidade da Unemat em Diamantino.
O crédito suplementar aberto por Silval Barbosa para financiar a aquisição da Uned também foi aberto de forma ilegal, segundo o MPE.
Além do prestígio obtido pelo governador Silval da Cunha Barbosa, também atendeu às pretensões políticas de Francisco Anis Faiad e Adriano Aparecido da Silva, pois disputaram o pleito de 2014
“Por encerrar uma transferência de capital para fazer frente a um investimento que suplantava o exercício de 2013, deveria constar expressamente do plano plurianual, quando sequer havia uma lei autorizando a abertura do Campus de Diamantino, mediante a aquisição das instalações da Uned”.
Para o promotor, assim que adquirida a unidade, o Estado deveria imediatamente ter promovido concurso público para a contratação dos servidores e docentes.
“Tal solicitação não foi acolhida pelo Estado de Mato Grosso, na condição de destinatário da referida solicitação, em razão da ausência de margem orçamentária para a contratação de novos profissionais por concurso público. Ressalte-se que tal justificativa tornaria a ser apresentada nos exercícios subsequentes (fls. 16/20), sobretudo em razão do agravamento da situação financeira do Estado de Mato Grosso, verificada sob a égide de um novo governo”.
Danos ao erário
Diante de todas as ilegalidades constatadas, o MPE concluiu que a ação dos envolvidos causou danos aos cofres públicos, “em razão do ilícito em apreço e as consequências acarretadas para a qualidade do serviço público de ensino”.
“Também se justifica o ressarcimento, em razão do potencial prejuízo decorrente da ausência de garantia à manutenção do serviço público, enquanto prestado por profissionais contratados precariamente. Não há como a Unemat garantir a seus cidadãos que o serviço continuará a ser prestado, ao término dos contratos firmados, sobretudo quando parte considerável da estrutura burocrática da Administração se encontra vinculada à reitoria da referida instituição de ensino. Eventuais alterações verificadas na direção política da Unemat, sobretudo em razão da mudança de sua gestão, poderão levar a descontinuidade do serviço”.
“A considerável rotatividade de docentes, revelada pela duração de seus vínculos com o Campus de Diamantino da UNEMAT, se apresenta como uma barreira intransponível à consolidação de um ambiente de produção, discussão e divulgação do conhecimento. Não é por outra razão que as queixas à qualidade do ensino na referida unidade de ensino superior persistem”.
A situação averiguada, conforme o promotor, causou desprestígio à Unemat e ao Estado, “em razão da precariedade dos quadros administrativos do Campus de Diamantino-MT, ostensivamente veiculado na imprensa local e nacional, e que ainda deu causa a diversas denúncias”.
“A ausência de margem orçamentária da Unemat para regularizar o quadro de pessoal do Campus de Diamantino, afora os parcos investimento na expansão e melhoria das instalações do Campus de Diamantino da Unemat, pode ser seguramente imputado aos réus Adriano Aparecido da Silva e Ariel Lopes Torres, então encarregados da gestão da referida Fundação Pública. A coparticipação do Estado de Mato Grosso no provimento de cargos da referida entidade da administração pública indireta - tal como prevem os arts. 66, XI, e 129, VIII, da Constituição do Estado de Mato Grosso – se traduz na responsabilização dos demais corréus: Francisco Anis Faiad, José de Jesus Nunes Cordeiro e Silva da Cunha Barbosa”.
“Ressalte-se, por fim, que a encampação das instalações da UNED rendeu dividendos políticos, na medida em que foi alvo de cobertura pela imprensa local e regional, em meio a sua repercussão na população dos municípios atendidos. Além do prestígio obtido pelo governador Silval da Cunha Barbosa, também atendeu às pretensões políticas de Francisco Anis Faiad e Adriano Aparecido da Silva, pois disputaram o pleito de 2014”, disse o promotor, na ação.
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