Vinícius Bruno ? Especial para FocoCidade
Em tempos onde as mídias sócias dão voz a todos, ser contraditório aos grandes conglomerados de comunicação passou a ser sinal de resistência. Afinal, produzir conteúdo de qualidade sem as grandes margens financeiras ao custo de anúncios de órgãos públicos se transformou em uma grande guerra no campo da comunicação.
Não se entra no mérito da opinião dos indivíduos pensantes ou não que ora fazem das redes sociais um palco de ideias, opiniões, bandeiras, conflitos ou afinidade. Aqui se entra no mérito dos meros mortais que digladiam contra os velhos titãs.
Trata-se de interesses ora libertadores ora de maior submissão das massas ao pensamento único. Eis o que defende a jornalista Laura Capriglione, há mais de 30 anos atuando na área de comunicação, e hoje pertencente ao grupo “Jornalistas Livres”, movimento cuja pretensão é ser contraponto ao que chamam pensamento único, que por sua vez é estratégia revelada dos conglomerados para defender a “Casa Grande”.
Confira a entrevista na íntegra:
Percebe-se que a grande mídia, apesar das redes sociais ter cada dia mais força, ainda há grande poder de manipulação por determinados veículos. Desde o processo de impeachment da Dilma e do processo contra o ex-presidente Lula, é possível dizer que houve tendencionismo por parte dos veículos de comunicação?
Não tenho dúvida de que a hegemonia ideológica quem mantém são os grandes conglomerados de mídia, que se você espremer vão sobrar uma cinco ou seis famílias que controlam os meios de comunicação no Brasil. A Folha por exemplo tem a Agência Folha, o Estadão tem a Agência Estado, a Globo, por exemplo, chegou ao paroxismo de controlar todos os jornais do Rio de Janeiro. Antes se tinha o jornal O Globo e o Jornal do Brasil, agora se tem O Globo, o Extra, a Rádio Globo, as revistas da Globo, a TV Globo, ou seja, a Globo hoje tem a posse da mentalidade, dos corações do Rio de Janeiro. É uma situação muito complexa e um desafio para nós jornalistas introduzir algum contraditório nisso. A verdade é que quando derrubaram a Dilma e criminalizar o PT, todos os grandes grupos se juntaram e também a Record, que era uma nota dissonante na comunicação do Brasil, até mesmo porque é de um grupo evangélico e tinha uma lógica de disputa de fieis, que fez com que a Record se rivalizasse com a Globo no passado, mesmo essa Record se alinhou em gênero, número e grau. Eu quando entrei no jornalismo há trinta anos, os jornais adoravam a contradizer um ao outro, era uma disputa pelo melhor apuração, com isso tínhamos a Folha que adora contradizer o Estadão, ou contradizer a Veja. E hoje em dia não, a Veja publica uma capa e durante a semana inteira fica todo mundo repercutindo, e este assunto vai ser a principal chamada do Fantástico, e todo mundo vai ficar batendo na mesma tecla. Dessa forma ao invés de haver uma competição, que seria o razoável, como acontece em qualquer país civilizado, no Brasil não, um fala e o resto do coral repercute. Isso tudo é preocupante. E penso que o governo do PT deveria ter enfrentado mais fortemente o monopólio da mídia, mas não enfrentaram e agora e estão pagando o preço caro.
A hegemonia ideológica quem mantém são os grandes conglomerados de mídia.
Pode-se dizer que o PT, principalmente o ex-presidente Lula esteja pagando um preço caro por não ter feito este suposto enfrentamento?
Sem dúvidas, o Lula está pagando um preço muito caro, porque todo dia há 15 anos ele vem sendo criminalizado na mídia. E temos usado as mídias alternativas para fazer uma contra narrativa. No futuro, bem ou mal, quando forem ter que contar a história deste Golpe, também vão ter que contar a história da resistência que a mídia alternativa fez e continua fazendo via Facebook e Blogs independentes. E o engraçado é que estamos fazendo isso em conjunto com a imprensa internacional, porque ela também denunciou o Golpe e o chamou de absurdo. Enquanto isso os grandes conglomerados continuam defendendo a “Casa Grande” como sempre fizeram.
O governo do PT deveria ter enfrentado mais fortemente o monopólio da mídia, mas não enfrentaram e agora e estão pagando o preço caro.
Por outro lado, os jornalistas ficamos um pouco de mãos atadas diante de tudo isso, afinal precisamos estar inseridos no mercado de trabalho. E este mercado está cada vez mais saturado e com menos oferta. Diante dessa perspectiva, por mais ideologia que um profissional possa ter, como ele pode fazer a diferença?
De fato isso é muito angustiante. Penso que cada vez mais os veículos de comunicação são editorializados. E este está sendo o problema, porque antes a voz do dono era demarcada pelo editorial, era o local específico para a opinião do dono. O resto do jornal corria meio que solto. Agora cada vez mais os donos dos veículos fizeram o garrote no pescoço dos jornalistas e dizem o seguinte: ou é isso ou você está na rua. E como a internet paradoxalmente propiciou que os jornais diminuíssem a mão de obra, hoje se tem uma oferta muito maior de mão de obra do que vagas para trabalhar. Com isso, os donos veículos selecionam, e dizem na tua cara, não gosto muito dessa história aí de ser diretor de centro acadêmico, engajado em movimentos sociais. Isso é angustiante, mas por outro lado, nunca se teve tanta possibilidade para se expressar fora da grande mídia, pois existem muitos blogs independentes, que apesar da dificuldade estão aprendendo a viver com as próprias pernas. Acredito que o desafio é encontrar uma gestão profissional que permita produzir informação de qualidade, pois não se pode abrir mão da veracidade, da credibilidade, de todos os atributos de uma boa matéria. Mas a gente tem que aprender a disputar o apoio do mercado anunciante e do mercado leitor. O leitor que se sente representado por determinada publicação, ele quer sustentar essa publicação. E nós temos que ser capazes de mobilizar esse sentimento. O problema é que muitos de nós estamos pensando na guerra ao invés de pensar em se profissionalizar.
Falando em guerra, hoje existe um fenômeno do confronto de ideias nas redes sociais. Muita gente tenta defender seu posicionamento ultraconservador ou ultra progressista sem diálogo. No próximo ano vamos ter eleições, e já é possível esperar um período tenso de discussões?
Acredito que sim. O que acho engraçado é que temos tanta informação à disposição, mas uma forma das pessoas se protegerem deste excesso de informação é exatamente se fechando em suas convicções. Hoje se dita a regra do “não tenho provas, mas tenho convicções”. Cada vez mais a gente usa isso, não só lá o promotor Dallagnol, mas as pessoas usam como mecanismo de defesa. Porque vamos combinar, é duro você no meio de tanto falatório se localizar. Vem a pergunta: para onde eu vou? Acredito nisso ou naquilo? E são tantas mentiras, tem fake news para todos os gostos, seja na esquerda seja na direita. E o indivíduo que não se protege fica catatônico, igual cego no tiroteio. E nesse momento que vem as agressões, a pessoa já fala logo que não quer discutir e passa para a ofensa como se fosse a solução. Infelizmente a sociedade ainda vai ter que amadurecer e este é um processo longo. Para isso temos que localizar quais são as ilhas de verdade que existem, já que na rede cabe tudo: verdades, mentiras, difamação e anonimato. E onde cabe o anonimato cabe qualquer coisa. Mas acredito que as pessoas vão aprender a conviver com isso e precisar localizar as ilhas de credibilidade, seja na esquerda ou na direita. Não existem só pessoas na esquerda que falem a verdade, na direita também existem aqueles que falam a verdade.
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