No mundo antigo grego, os cidadãos atenienses se reuniam na Ágora, onde discutiam sobre as questões da cidade. Não se tem registros se Sócrates, Platão e Aristóteles tivessem estado em um desses encontros de debate. Talvez, não tenham ido mesmo. Quem sabe por estarem envolvidos em demasia com os problemas da academia, e de suas causas e temáticas. O certo, contudo, é que não compareceram.
Embora tivessem travados outros diálogos, até bem mais acirrados, a respeito de tantas outras coisas, e não apenas as citadinas. Sócrates, por exemplo, travou conversações diárias com uma porção de pessoas, sempre com a crença no resultado da confrontação de posicionamentos.
Pois, assim como a gestante carece de obstetra, o indivíduo com a alma grávida de ideias precisa também de um obstetra, só que espiritual (maiêutica). Em “O Banquete”, de Platão, travou a discussão sobre “Eros”, além de ter combatido as práticas sofistas, tal como fizeram aqueles dois filósofos, enfrentado de peito aberto o julgamento em que fora submetido, e cobrado dos jurados a razão e a verdade.
Razão e verdade, séculos depois, ausentes da política-eleitoral, ainda que se tenham – de lá para cá - passados por revoluções, mudanças e por vários sistemas de governo e político. As necessidades presentes são bastante distintas das do pretérito, e igualmente serão amanhã, porém prevalecem os ensinamentos de Górgias, com o jogo de palavras, o que depende sobremaneira da habilidade de quem o executa.
Acontece que não se tem tanta gente boa nisso, como se tinha no passado, quando prevalecia o conflito de palavras, com palavras, embora tivessem registros de agressões pessoas e verbais, inclusive nos Parlamentos. Uma pena! Afinal, neste conflito de palavras, ideias são concebidas, soluções aos problemas, encontrados. Avanços registrados. Nem tanto com a robustez necessária para impedirem que tivessem os retrocessos, e com estes os desacordos, o que resultaram os lances de não convivência com quem tenham posicionamentos diferentes de quem se encontram no poder.
Oponentes, então, deixam de ser adversários, e são transformados em inimigos. Condição de aniquilamento. As ditaduras se valeram muito desta tática: eliminação sumária dos que as não aceitavam. Famílias foram destruídas, pessoas tiveram suas vidas ceifadas.
Situação mudada. Os tempos, agora, são bem outros. Casas não são mais invadidas, nem crianças levadas à condição de órfãs, por conta das forças do Estado. Sem, contudo, ter sido expurgada a violência. Violenta-se a liberdade, toda vez que se tem a lacração, inclusive nas redes sociais. Violenta-se a harmonia entre os poderes, toda vez que alguém – independentemente de quem seja - se acha no direito de agredir as instituições, avacalhar os preceitos democráticos, quando toma para si o preconceito, e o faz de arma para desvalorizar e subtrair o humano que há em outrem, em razão de sua cor, da pobreza, do sexo, do credo e da opção sexual.
Violenta-se a pátria ao tentar atacar a pluralidade. Este tipo de atitude se contrapõe com o discurso de muitos. Assoberba os conflitos. Conflitos indesejáveis. Ao contrário dos desejáveis, que se dão pela palavra, e com a palavra (não agressiva, nem ameaçadora). Estes, não aqueles, congregam, afinal, pode se opor a uma pessoa, sem tê-la como inimiga, reconhecendo-a como aquela que se decidiu ser quem é.
Preceito alimentador da convivência na Ágora, apesar do uso único da retórica, do fazer com as palavras trapézio, à moda gorgiana, sem que a verdade e a razão viessem a ser protagonistas. Afinal, lá quanto cá, a protagonista sempre foi à mentira, e, o pior de tudo, é que, na democracia, o uso desta pode garantir uma vitória eleitoral de alguém, ou alguns. É isto.
Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.
Ainda não há comentários.