• Cuiabá, 21 de Novembro - 00:00:00

Uma Nova Chance

Se conversarmos com as pessoas nas ruas, nos centros de compras, nos parques, perguntando a elas o que desejam para aqueles que cometeram os crimes mais diversos, desde furtos até latrocínios ou estupros, principalmente quando tais atos são cometidos contra crianças ou mulheres que não puderam oferecer resistência ou defesa, a tendência é que ouçamos coisas do tipo: “devem apodrecer na cadeia”; ou “deveriam morrer”; ou algo similar a isso.

É natural do nosso lado mais instintivo do que racional a busca pela vingança, ainda que seja uma vingança social, sobretudo quando nossas emoções são diretamente e inevitavelmente afetadas por esses crimes bárbaros, ao passo que o ideal, passado o momento de cólera gerado por tais fatos, seria exercitar em nós o senso de justiça, de fazer com que o autor do crime possa de alguma forma reparar à sociedade e às vítimas o mal que tenha proporcionado, bem como para que no período punitivo tivesse meios para moralmente recuperar-se, o que poucas vezes tem sido possível, na prática, mas merece menção o trabalho das instituições religiosas junto ao sistema penitenciário, ofertando recursos para que o reeducando angarie forças pela fé com a finalidade de buscar uma vida fora do crime em seu retorno à sociedade.

No Brasil não existe prisão perpétua, logo, mais cedo ou mais tarde o cidadão que cometeu qualquer delito, que foi julgado e condenado a ter sua liberdade cerceada, ficando sob custódia do Estado em unidade penitenciária por tempo determinado pelo Poder Judiciário, será libertado após o cumprimento da pena. As estatísticas nos dão conta de que oito entre dez egressos do sistema prisional voltam a cometer crimes. É claro que existem diversos fatores para isso, seja pela condução e acompanhamento que é feito por organizações criminosas, seja pela crise econômica e desemprego, ou mesmo por uma predisposição intelecto e moral do cidadão. Mas o fato a ser encarado é a necessidade de mais paz em sociedade. É isso que nos interessa, razão pela qual não adianta virar as costas para tal fenômeno social que nos afeta a todos.

Em Mato Grosso, o trabalho desenvolvido pela Fundação Nova Chance certamente é aquele que mais se ocupa efetivamente com o melhor retorno possível do egresso do sistema prisional e os jovens do sistema socioeducativo ao meio social, fazendo uma ligação entre essa pessoa e empresas para, por meio do trabalho digno, diminuir ao máximo a possibilidade de novo envolvimento com atos ilícitos.

Enquanto a secretaria adjunta de Administração Penitenciária, vinculada à secretaria de Estado de Segurança Pública, cuida dos meios adequados para que o condenado cumpra a pena que lhe foi imputada, com todas as práticas referentes à alimentação, acomodação e infraestrutura, controle de visitas e de materiais que entram nas unidades, escoltas e manutenção da ordem contra fugas ou eventuais motins, representando, assim, uma das forças de segurança pública, a Fundação Nova Chance é uma fundação pública estadual pertencente à administração indireta responsável não pelo lado da força, mas pelo lado da oportunidade de um recomeço. Assim sendo, lançando mão de atividades de assistência e promoção do cidadão com a participação de suas famílias nesse delicado e grave processo de reintegração no meio social, principalmente por meio de cursos profissionalizantes e trabalhos inclusive durante o cumprimento da pena, essa fundação tem alcançado ótimos resultados.

Aliás, o trabalho é uma das formas mais relevantes de reintegração social, tanto por ser uma forma de evolução profissional, quanto por permitir a remissão da pena, pois a cada três dias trabalhados um dia de pena é descontado. E cada vez mais as empresas e o Poder Público tem firmado contratos e convênios com a Fundação Nova Chance com o objetivo de contratar a mão-de-obra dos reeducandos, de modo que todos ganham com isso: o apenado por trabalhar, sentir-se valorizado, receber salário (não inferior a 3/4 do salário mínimo) e diminuir o tempo de privação de liberdade; a empresa ou órgão público contratante, pois contará com o labor de pessoas que valorizam muito essa oportunidade e constituem uma mão-de-obra de baixo custo e bom retorno, além de estarem, os contratantes, contribuindo para o bem social; e ganha também a sociedade como um todo, porquanto há uma considerável chance de o apenado decidir por continuar trabalhando de forma lícita após o cumprimento da pena.

Uma nova chance! É isso que essa fundação realiza para o bem de todos. Isso não significa que as instituições públicas, privadas ou do Terceiro Setor que lidam com esses desafios estão a favor do crime ou do criminoso, “passando pano pra bandido” como popularmente se diz. É preciso ir mais além dessa visão vingativa e superficial, porque, conforme dito antes, eles voltarão para suas famílias, para nossos bairros, para a nossa sociedade.

Por tudo isso, todo esforço do governo ou de parlamentares, por meio de suas emendas ao orçamento que muitas vezes são usadas de forma menos efetiva e somente para formar currais eleitorais, é bem-vindo e necessário para o bem de todos, fortalecendo as instituições corajosas que trabalham pela reinserção do cidadão que errou e que, “para o bem de todos”, merece uma nova chance.

 

Nestor Fidelis é advogado em Mato Grosso.



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