Um dos questionamentos que mais recebemos é:
Sobre o abono de permanência de servidor municipal vinculado só RPPS. Quando o servidor requer sua aposentadoria e continua trabalhando (licença especial) aguardando a homologação pelo tribunal de contas.
Este faz jus ao abono?
Entende que o instituto deve conceder administrativamente?
Antes de apresentar a resposta ao questionamento, é preciso destacar que o Abono de Permanência é uma verba de natureza remuneratória e como tal não se sujeita à competência das Unidades Gestoras previdenciárias, sendo sua concessão, portanto, atribuição dos órgãos responsáveis pela gestão de pessoal do respectivo Ente.
Superada essa questão, há de se ressaltar que uma das maiores polêmicas do Regime Próprio reside justamente na indagação apresentada, já que o regramento constitucional atinente ao Abono é claro no sentido de que sua concessão deve ser feita ao servidor que podendo se aposentar opta por continuar a exercer as atribuições do cargo público.
Razão pela qual o extinto Ministério da Previdência estabeleceu na Orientação Normativa n.º 02/09 que:
Art. 86 ...
§ 4º O pagamento do abono de permanência é de responsabilidade do respectivo ente federativo e será devido a partir do cumprimento dos requisitos para obtenção do benefício conforme disposto no caput e § 1º, mediante opção expressa do servidor pela permanência em atividade.
Previsão essa que vem sendo entendida pelos Regimes Próprios como a imposição de que a concessão do abono deve se dar mediante a apresentação de requerimento, motivo pelo qual, seu pagamento e o de possíveis retroativos deve ser feito considerando a data da apresentação do pleito administrativo.
E como o artigo 9º, inciso I da Lei n.º 9.717/98, outorgou ao Ministério o poder de promover tais orientações, as quais são de observância obrigatória pelos Regimes Próprios, sob pena de descumprimento, para efeitos de emissão/renovação do Certificado de Regularidade Previdenciária, de normas tidas como normas gerais, sua literalidade tem sido observada administrativamente.
Ensejando a conclusão de que a concessão do Abono pressupõe a apresentação do requerimento administrativo, o que inclusive impede o reconhecimento do direito a este durante o transcurso de processo de aposentadoria, já que essa vontade é incompatível com a intenção de continuar na ativa pressuposto constitucional para a concessão do Abono de Permanência.
Entretanto, não podemos nos furtar a reprodução de nosso entendimento pessoal acerca da matéria, manifestado em nosso livro DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO, 3ª edição, editora LTr, cujo teor é o seguinte:
Outra questão intricada é a de quando o Abono começa a produzir efeitos: se da data da formulação do requerimento ou da implementação dos requisitos.
A primeira situação encontra fundamento no argumento de que a opção expressa pela permanência em atividade se concretiza com a apresentação do requerimento de abono de permanência. A segunda, no simples fato de que o direito ao abono se incorpora ao patrimônio do servidor quando este alcança os requisitos para se aposentar e continua trabalhando optando por pemanecer em atividade de forma tácita.
Como o texto constitucional em momento algum fala em opção expressa por permanecer em atividade, a segunda interpretação é a que mais se adequa ao ordenamento jurídico pátrio, sendo inclusive a adotada pelo Ministério da Previdência Social por intermédio da Orientação Normativa n. 1/2004, em seu art, 67, § 4º, hoje substituído pelo § 4º do art. 86 da Orientação Normativa n. 2/2009.
Entendimento esse que também está consolidado no Supremo Tribunal Federal como se vê:
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. SERVIDORA PÚBLICA. MOMENTO DO RECEBIMENTO DO ABONO DE PERMANÊNCIA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 359/STF. 1. O Supremo Tribunal Federal possui o entendimento no sentido de que o termo inicial para o recebimento do abono de permanência ocorre com o preenchimento dos requisitos para a aposentadoria voluntária. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (ARE 825334 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 24/05/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-119 DIVULG 09-06-2016 PUBLIC 10-06-2016)
EMENTA CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. AUXÍLIO-DOENÇA E ABONO DE PERMANÊNCIA. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DOS ARTIGOS 53 E 89, § 1º, DA LEI Nº 7.114/2009 DO ESTADO DE ALAGOAS, QUE REESTRUTURA O REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES ESTADUAIS, POR VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 5º, XXXVI, 37, XV, 40, § 19, E 194, PARÁGRAFO ÚNICO, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. PROCEDÊNCIA PARCIAL... 2. O abono de permanência deve ser concedido uma vez preenchidos os seus requisitos, sem necessidade de formulação de requerimento ou outra exigência não prevista constitucionalmente. A jurisprudência desta Suprema Corte tem afirmado que cumpridas as condições para o gozo da aposentadoria, o servidor que decida continuar a exercer as atividades laborais tem direito ao aludido abono sem qualquer tipo de exigência adicional... (ADI 5026, Relator(a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 03/03/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-053 DIVULG 11-03-2020 PUBLIC 12-03-2020)
Portanto, tomando por base tais posicionamentos há de se concluir que a concessão do Abono independe de prévio requerimento administrativo, de forma que os Entes Federados que adotam o entendimento de que este é necessário, podem sofrer uma série de demandas judiciais para o reconhecimento do direito ao mesmo de forma automática.
Bruno Sá Freire Martins, servidor público efetivo do Instituto de Previdência do Estado de Mato Grosso - MTPREV; advogado; consultor jurídico da ANEPREM e da APREMAT; pós-graduado em Direito Público e em Direito Previdenciário; professor de pós-graduação; membro do Conselho Editorial da Revista de Direito Prática Previdenciária da Paixão Editores; escreve todas as terças-feiras para a Coluna Previdência do Servidor no Jornal Jurid Digital (ISSN 1980-4288 - www.jornaljurid.com.br/colunas/previdencia-do-servidor), para os sites fococidade.com.br e entrefala.com.br, autor dos livros DIREITO CONSTITUCIONAL PREVIDENCIÁRIO DO SERVIDOR PÚBLICO, A PENSÃO POR MORTE, REGIME PRÓPRIO – IMPACTOS DA MP n.º 664/14 ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS e MANUAL PRÁTICO DAS APOSENTADORIAS DO SERVIDOR PÚBLICO, todos da editora LTr, do livro A NOVA PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS (editora Alteridade) e de diversos artigos nas áreas de Direito Previdenciário e Direito Administrativo.
Ainda não há comentários.