• Cuiabá, 21 de Novembro - 00:00:00

O Patriota

Todos reivindicam por liberdade. Não é para menos. Pois o ser e ter reconhecido como livre é o pulsar que faz agigantar o país e o seu povo, ainda que outrora ambos tenham sidos escravos. Até porque inexiste liberdade a um deles, ou aos pedaços, ou a conta-gotas, ou apenas para a Pátria, sem que seus filhos venham a sê-los. Daí a importância de se lembrar de um trecho poético, quase lamento, embora soe como pedido, meio súplica: “Liberdade! Liberdade! Abre as asas sobre nós!”. Calma! Espere. Não se trata de um refrão de samba-enredo, ainda que tenha sido utilizado pela escola Imperatriz Leopoldinense, em 1989. Mas, isto sim, do trecho do refrão do Hino da República.  

Refrão e hino completamente esquecidos. E esquecidos pela imensa maioria da sociedade brasileira. O esquecimento faz parte da vida, ou melhor, de sua turbulência, ocasionada também pelo corre-corre ou pela crise econômica, ou sob o efeito do desemprego. Mesmo que não se esteja sob o excesso de álcool, estresse e ansiedade e depressão, tampouco com o Mal de Alzheimer. Quem é que nunca se esqueceu de algo ou de alguma coisa? Esquecer-se é, portanto, comum, e ocorre com qualquer pessoa, independentemente da idade, sexo, conta bancária e da religião.

Inclui-se aqui, claro, aqueles que, ultimamente, vem se auto-intitulando “patriota”. Palavra e sentido, inaceitavelmente, desvirtuados, desfigurados e interpretados incorretamente. Isto porque “o ser patriota” foi propositadamente retirado da esfera do “amar a terra e servi-la”, conforme se encontra no dicionário da língua portuguesa, ou exemplificado em “Incidente em Antares”, de Érico Veríssimo, ou ainda que se coloque como Policarpo Quaresma, na obra de Lima Barreto. Mas, infelizmente, elevada a condição de torcer sem limites a um governante.

E, neste caso, as pessoas contentam-se tão somente com o papel de aplaudir, de oba-oba, de ser apenas platéia. Condição que, infelizmente, subtrai-lhes a racionalidade, a reflexão, o bom senso e poder de crítica. O pior, porém, é acharem que as demais deveriam imitá-las, e as que não as seguem são tachados de “disto” ou “daquilo”, além de serem considerados “não-patriotas”. Deus do céu! Tamanha inversão de valores! Considerados justamente por quem jamais soube o significado de ser patriota, uma vez que este ser ama o seu país, sua terra, sem jamais renunciar ou abrir mão de sua liberdade. A liberdade de enxergar, de analisar, de expressar sobre o que vem acontecendo e o de acompanhar detalhadamente as ações dos agentes públicos, dos agentes político-públicos. Aliás, escreveu Norberto Bobbio, em “O Futuro da Democracia”, governo democrático é o governo visível, pois nada se tem debaixo do tapete, debaixo dos panos. E, para que isto venha acontecer, de verdade, é preciso que cada um dos brasileiros cobre do governante que cumpra com suas responsabilidades. Cobrar é uma necessidade premente. Diferentemente do torcer. Já que o governante tem um salário maiúsculo, muito maior que a imensa maioria da população, e conta com todas as estruturas físicas e de pessoal necessárias para desempenhar, e bem a função para qual fora eleito e tomou posse.

Cobrar é um verbo que se alinha, sem ser sinônimo, claro, ao de fiscalizar. Ambos são resultados da vida que se conquistou, não mais atrelada ao fundo da caverna, ou ao estágio de escravidão, ou às ditaduras. Ainda que se corram riscos, jamais o de retornar ao que foi outrora. Nada disso. Mas o de ampliar o viver democrático, cuja argamassa é, e sempre foi e será a liberdade. É isto.

 

Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.

E-mail: Lou.alves@uol.com.br.   



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