A fratricida guerra comercial deflagrada pelo presidente americano Donald Trump contra o império do dragão, a China, vai produzir efeitos positivos na economia de Mato Grosso. Pelo menos no curto prazo, pois a China suspendeu as compras de produtos agrícolas dos Estados Unidos. Com isso, deve comprar mais soja, milho e carnes de Mato Grosso, aumentando nossas exportações. O dólar valorizado perante o real turbinará ainda mais os lucros dos exportadores. Mas não devemos soltar fogos de comemoração, pois o prolongamento dessa disputa vai causar efeitos nefastos na economia mundial, com reflexos negativos na economia mato-grossense. Puxará para baixo o crescimento global, reduzindo os preços das commodities agrícolas, como soja, milho, carnes suínas e de frango, nossos principais produtos de exportação.
Ao levar a guerra comercial para seu estágio mais perigoso, o presidente Trump anunciou que vai sobretaxar, a partir de setembro, os produtos chineses importados pelas empresas americanas. O dragão reagiu no dia seguinte. O Banco Central da China desvalorizou sua moeda, levando a 7 yuans por dólar, relação nunca vista antes. O yuan mais fraco favorece as exportações chinesas retomando sua competitividade abalada com o aumento das tarifas impostas pelos EUA.
Foi apenas um espirro do dragão, mas suficiente para os mercados mundiais imediatamente ficarem resfriados. O mundo inteiro passou a temer que o resfriado possa virar pneumonia. Bastou o breve sinal e os mercados financeiros do mundo inteiro entraram em pânico. Investidores buscaram lugares seguros para ancorar seu dinheiro, fugindo dos países emergentes. Todas as bolsas da Ásia, Europa, EUA, Brasil caíram. A bolsa de Wall Street sofreu seu pior dia do ano, o rendimento dos títulos do Tesouro Americano caiu como reflexo da insegurança causada pela medida completamente inesperada dos chineses. A Apple, que tem grande parte de sua produção na China perdeu US$ 69,2 bilhões em valor de mercado num único dia, para ficar em apenas um exemplo. Caíram os preços do petróleo, minério de ferro, soja e carnes. Quebrando uma longa tradição, o Tesouro dos EUA rotulou a China de “manipuladora de moeda”. Soou engraçado, como se os EUA não fossem “manipuladores de tarifas comerciais”.
A bolsa brasileira, B3 (antiga Bovespa), teve forte queda, o dólar foi a R$ 4,00 e as ações da Vale caíram quase 4%. A última vez que o dragão havia espirrado foi em 2006 e o mundo inteiro teve um resfriado que virou pneumonia em 2008.
As medidas duras de ambos os lados sinalizam um longo e difícil caminho para solução da disputa comercial, causando danos à economia mundial no médio e longo prazo.
A questão é saber qual o limite que Pequim vai impor na desvalorização de sua moeda para enfrentar o tarifaço imposto por Trump. A espiral de desvalorização pode elevar a inflação, comprimir gastos das famílias, ocasionar desordenadas transferências de dinheiro através de fronteiras, restrição do comércio internacional. Tudo isso abala a confiança dos empresários, desacelerando o já tímido crescimento da economia mundial.
Em meio a esse turbilhão comercial, o agro de Mato Grosso obterá ganhos no curto prazo com a expansão das exportações, mas deve perdê-los logo à frente se os líderes não encontrarem uma alternativa razoável para essa guerra desvairada.
Caso Donald Trump tivesse consultado os sábios anciãos da minha bucólica Alto Paraguai teria, provavelmente, ouvido: não mexa com um tigre, mesmo que estiver dormindo. Sempre será um tigre.
Vivaldo Lopes é economista formado pela UFMT, onde lecionou na Faculdade de Economia. É pós-graduado em MBA Gestão Financeira Empresarial-FIA/USP (vivaldo@uol.com.br)
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