Tenho cultivado o hábito de ano a ano registrar o tempo de minha estada em Mato Grosso. Hoje completam 42 anos desde que cheguei. Tinha 32 anos e a vontade louca de mudar o mundo. Vinha de uma geração de estudantes formados nas universidades brasileiras com o profundo espírito nacionalista de transformar o país. Diferente hoje!
Vim de Brasília sozinho no meu velho Corcel 4 portas azul. Já eram asfaltadas há três anos as rodovias ligando Cuiabá ao Sul e ao Sudeste do país. Tudo girava em torno de Cuiabá, a capital do Norte e do Sul do Estado. Mas no bastidor o jogo pela divisão era bruto a partir do sonho histórico do pessoal do Sul. Cuiabá tinha 100 mil habitantes. Pequena. Provinciana. Acolhedora.
Um privilégio ter vivido nela daquele jeito. Gente mansa, jeito manso. Progresso proporcional. Porém, havia um espírito de fé muito marcante. Ninguém duvidava de que haveria um grande futuro, embora o presente naquele tempo não indicasse isso. Asfalto só no centro. O córrego da Prainha corria a céu aberto dentro de um canal que sempre acolhia o carro de algum bêbado descuidado.
Vim trabalhar no governo do Estado na área de comunicação. Equipe pequena. Viajávamos semanas seguidas pelo imenso Estado com seus 76 municípios no Norte e no Sul. Vivíamos em cima dos aviões. O governo do estado possuía 32 aviões pra dar conta de cobrir todo no território. 16 em Cuiabá e outros 16 em Campo Grande. Tudo era dividido meio a meio.
Comparando o ambiente de hoje em todas as áreas e o daquele momento de 1976, tivemos um salto de séculos. A população saltou pra 3 milhões 226 mil habitantes. A cara das pessoas mudou com a chegada de sucessivas levas de migrantes de todas as regiões do país, especialmente do Sul e do Sudeste.
Pouca gente daquele tempo ainda está conosco pra relembrar tão rica história. As gerações atuais continuam e logo, logo, também deixarão o seu legado aos herdeiros.
De minha parte, ter vivido aqui esses 42 anos, foi mais que um privilégio. Foi a oportunidade de ver o tempo saltar sobre si mesmo e uma civilização antiga construir outras. Penso que, provavelmente não assistirei à construção das seguintes. Mas só essa valeu mais que uma vida!
Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso
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