Nailton Reis
Falar sobre saúde mental de pessoas LGBTQIAPN+ é também falar sobre cansaço. Um cansaço que não nasce dentro, mas que vai se formando do lado de fora: nos olhares atravessados, nas piadas disfarçadas de afeto, nas perguntas que ninguém faria se você fosse hétero, branco e discreto. O que adoece não é a identidade — é o mundo que insiste em tratá-la como erro.
Há quem aprenda desde cedo a esconder o gesto, engrossar a voz, evitar o toque. Há quem fuja da própria imagem no espelho porque aprendeu que existe um "jeito certo" de ser homem. E há quem cresça tentando se enquadrar, na esperança de ser aceito, desejado ou ao menos deixado em paz. Mas a verdade é que moldar-se ao padrão alheio quase nunca protege: só adia o sofrimento.
Os impactos disso tudo não são invisíveis para a psicologia. Ansiedade, depressão, insônia, medo constante de rejeição, baixa autoestima. Muitos desses sintomas não nascem da mente individual, mas das experiências repetidas de exclusão, humilhação e solidão. E o mais perverso é quando isso tudo acontece no silêncio: aquele silêncio que habita inclusive dentro da própria comunidade, onde o "jeito certo de ser" ainda é negociado entre masculinidades idealizadas e afetos permitidos.
A saúde mental precisa ser compreendida para além do consultório. Ela começa no acolhimento, na escuta sem correções, na liberdade de ser quem se é sem precisar justificar cada traço da própria identidade. E precisa, sobretudo, ser afirmativa: que valide, legitime e respeite as subjetividades diversas sem tentar moldá-las.
É urgente falar de cuidado com quem historicamente foi ensinado a se vigiar, se policiar e se reduzir. É urgente construir espaços onde não seja preciso escolher entre o afeto e a dignidade, entre o amor e a segurança, entre o toque e o medo.
Porque ninguém deveria adoecer só por tentar existir.
Nailton Reis é Psicólogo Clínico com especialização em Neuropsicologia Cognitiva Comportamental, Avaliação Psicológica e Psicologia do Trânsito em Cuiabá-MT
CRP 18/7767


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