Gonçalo Antunes de Barros Neto
A relação entre instinto e razão tem sido um dos temas mais debatidos desde os primórdios da filosofia. Enquanto o instinto se manifesta como uma força primordial e espontânea, guiada por impulsos biológicos e emocionais, a razão surge como a capacidade de reflexão, ponderação e tomada de decisões baseadas na lógica. Pensadores de diferentes épocas tentaram compreender como essas duas dimensões coexistem e influenciam a ação humana.
O conceito de instinto está frequentemente associado à biologia e à psicologia. Para Darwin (1809-1882), o instinto é uma herança evolutiva, moldada pela seleção natural. Os seres vivos, incluindo os humanos, carregam comportamentos instintivos que garantem a sobrevivência da espécie, como o medo do perigo ou o impulso de cuidar da prole.
Na filosofia, Schopenhauer (1788-1860) trouxe uma visão pessimista e determinista sobre o instinto, considerando-o uma manifestação da "vontade de viver", uma força cega e irracional que conduz todos os seres vivos. Para ele, os desejos instintivos são a principal causa do sofrimento humano, pois levam à busca incessante por satisfação, sem jamais alcançar uma realização plena.
Friedrich Nietzsche (1844-1900) também enfatizou o instinto, mas de maneira diferente. Para ele, a civilização e a moral tradicional reprimem os instintos do ser humano, resultando em frustrações e ressentimentos. Nietzsche valorizava a figura do "super-homem", aquele que é capaz de transcender as normas impostas e viver de acordo com sua própria natureza instintiva, sem culpa ou repressão.
Numa representação, se o instinto representa a força bruta da natureza, a razão é vista como um elemento distintivo da humanidade. Platão (427-347 a.C.) foi um dos primeiros filósofos a destacar a importância da razão, considerando-a a característica que diferencia os seres humanos dos animais. Em sua obra A República, ele propôs uma divisão da alma em três partes: a racional, a irascível e a apetitiva. A razão deveria governar as outras duas, garantindo uma vida justa e equilibrada.
Aristóteles (384-322 a.C.), discípulo de Platão, também valorizou a razão, mas a enxergou de forma mais prática. Em sua Ética a Nicômaco, ele destacou a importância da "phronesis" (prudência), que é a capacidade racional de tomar decisões sábias com base na experiência e na reflexão.
Vivendo no momento da agitação iluminista, Kant (1724-1804) reforçou a primazia da razão ao defender a autonomia moral do indivíduo. Para ele, a ética não deveria ser guiada por impulsos ou desejos, mas sim por princípios racionais universais, expressos no imperativo categórico. Segundo Kant, a verdadeira liberdade consiste em agir segundo a razão, e não ser escravo das paixões.
Contudo, sempre é bom ressaltar que, embora muitos pensadores tenham exaltado a razão como superior ao instinto, outros defenderam que ambos são essenciais para a experiência humana. Por exemplo, David Hume (1711-1776) argumentou que a razão por si só não pode motivar a ação. Em sua visão, as paixões (ou emoções) são as verdadeiras forças motrizes do comportamento humano, enquanto a razão apenas as orienta.
Na contemporaneidade, o neurocientista António Damásio destaca que emoção e razão não são forças opostas, mas interdependentes. Em sua obra O Erro de Descartes, ele argumenta que as emoções desempenham um papel fundamental na tomada de decisões racionais, inclusive é o comportamento emocional que diferencia as pessoas. Segundo suas pesquisas, pessoas com danos cerebrais que afetam suas emoções têm dificuldade em tomar decisões, demonstrando que a razão pura é insuficiente para guiar o comportamento humano.
Afinal, um excesso de racionalidade pode tornar as pessoas frias e calculistas, enquanto a entrega total ao instinto pode resultar em impulsividade e caos. A grande questão é encontrar a harmonia entre essas forças, permitindo que a razão ilumine os instintos e os instintos tragam mais vitalidade às ações.
É por aí...
Gonçalo Antunes de Barros Neto tem formação em Filosofia, Sociologia e Direito.
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