Já escrevi que existe uma diferença entre os conceitos de justiça e de direito.
O conceito de justo varia em razão de vários fatores, dentre eles em virtude do local, da época e da formação cultural de cada determinada sociedade.
O direito, por sua vez, trata da intervenção estatal ao impor regras de conduta através de lei, ou seja, se o Estado entende que deve reprimir certa atitude irá normatizar neste sentido, mesmo que cause alguma sensação de injustiça.
Geralmente se ouve dizer que certo procedimento é legal, porém imoral.
Ora, quando se tem esta sensação de que a lei é imoral ou injusta, fica claro que há um antagonismo entre justiça e direito.
Pois bem, foi amplamente divulgado que o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade de lei estadual que fixa a alíquota máxima de ICMS incidente sobre operações com energia elétrica e comunicação, a qual reflete diretamente no valor da fatura paga pelo consumidor.
De acordo com o STF, a Constituição Federal impõe que serviços e produtos essenciais devem ter a alíquota normal, geralmente fixada em 17% e não a máxima de 27%, a exemplo do que sempre vigorou no Estado de Mato Grosso até a presente data.
Trata-se da aplicação do Princípio da Essencialidade, o qual foi reiteradamente desprezado, tanto pelos Estados, como pelos Tribunais Estaduais ao enfrentarem tal questão.
Portanto, ao colocar um ponto final sobre a discussão, o STF aplicou o direito, posto que a regra da essencialidade está explicitamente prevista na Constituição Federal.
Ocorre que tão logo finalizado o aludido julgamento, a Corte Suprema iniciou a análise a partir de quando a referida decisão poderá gerar efeitos, sendo que já há um voto no sentido de que tal entendimento deve apenas prevalecer a partir do próximo ano.
Quer dizer, mesmo reconhecendo ser inconstitucional, portanto inválida a lei que exigia a alíquota no patamar máximo, o STF está na iminência de torná-la eficaz.
Surge então a hipótese legal, de ser declarada uma lei inválida, porém com a possibilidade de gerar efeitos.
Tal discussão é relevante porque ao prevalecer tal entendimento que trata da modulação dos efeitos daquela decisão, impede que os consumidores requeiram o direito à restituição do pagamento indevidamente efetivado.
Então surge no caso em questão um exemplo em que tal lei processual é manifestamente injusta, uma vez que permite que o Poder Judiciário estabeleça que o consumidor que pagou indevidamente o imposto cobrado nas respectivas faturas de energia e comunicação, não tenha o direito à devolução.
Voltando à análise inicial, está aí um exemplo de nítida legal injustiça, posto que embora tenha sido reconhecido o direito do consumidor contribuinte, o mesmo corre o nítido risco de não ter o direito para a justa restituição.
Victor Humberto Maizman é Advogado e Consultor Jurídico Tributário, Professor em Direito Tributário, ex-Membro do Conselho de Contribuintes do Estado de Mato Grosso e do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais da Receita Federal/CARF.
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