• Cuiabá, 21 de Novembro - 00:00:00

Obviedade

Discussões ou debates são próprios da democracia. Daí a importância da liberdade. Liberdade, sem o tacão das ditaduras. São estas, e não aquela, a aprisionarem e impedirem o livre manifestar-se. O manifestar-se sobre ou alguma coisa é uma ação política, mesmo que o assunto em pauta seja amenidade, ou a respeito de bugigangas, ou mais ou menos sérios, ou graves ou seríssimos.

Opinar-se é um manifestar-se, e este, claro, é político. Obviamente. Nem sempre, contudo, o óbvio parece ser visto por todos. Aqui, cabe a citação de Francisco Duarte Júnior, em “Realidade”: “se o ser humano vivesse no fundo do mar, a última coisa por ele notada seria a água”. Eis uma grande verdade. Verdade que se tornou mais evidente com a chegada da internet, das redes sociais. Então, surgiu um monte de especialistas. Especialistas de tudo. Mesmo que nada saibam do que falas. Nem gostam de ouvir o que alguém, estudioso de fato, tem para dizer-lhe. Mal percebem que o ouvir é mais importante que falar.  

Muito se aprende ouvindo, e escutando quem, realmente, sabe o que diz, e o que tem que ser ou precisa ser dito. Também se aprende, e muito mesmo quando se lê e se ouve estudioso que apresenta ideias e argumentos diferenciados do acostumado, e para os quais os ouvidos alienados não estão preparados. Resultado contrário se tem ao debruçar em algo que já se está acostumado, pois este apenas mantém o que já se pensa, sem fazê-lo rever o pensado. Revisão necessária. Imprescindível.

Afinal, toda opinião carece de fundamentação, a qual se constitui basicamente de dados, motivos, razões e fatos. Arsenal de argumento conseguido através do contato com leituras variadas e diversificadas. Não o obtém por telepatia, nem por herança biológica ou genética. Ainda que se queira, não será possível. Até porque sem a argumentação, o defendido não passa de achismo.  

Acha-se tão somente, sem que o achado venha acompanhado das colunas responsáveis por manterem de pé toda defesa. Mas é o achismo, e não a opinião, o predominante nas redes sociais. Isso é muito grave. Tão grave quanto à tática de tentativa de desqualificação do interlocutor. Desqualifica-o porquê a pessoa que desqualifica não possui conhecimento bastante para contrapor o dito. É mais fácil agir desse modo, que buscar atacar as falhas na argumentação utilizada, pois, neste caso, seria necessário ter, de antemão, conhecimento sobre o tema tratado. E, não a tendo, vale-se de ataques pessoais. Assim, desaparece o debate.

Com isso, some-se também a liberdade. Sem esta, claro, aparece a intolerância. Prevalece e predomina. Põe fim a democracia. Fortalece desse modo, o discurso único, como se a sociedade ou a comunidade fosse uniforme, com as diferenças e os diferentes sendo excluídos. Excluem-nas, ou tentam excluí-las por meio de ataques. Ataques sempre às pessoas.

Há uma porção de palavras que se usa para atacar, das mais agressivas às mais sutis, como o dizer “tudo é narrativa”. Termo que serve como fuga. Fuga para quem não quer enfrentar, ou melhor, não possui conhecimento o suficiente para contrapor com o que deveria ser enfrentado. Ignora-se o racional, o trato e a cordialidade. Tripé indispensável em debate ou discussão. Afinal, debater-se está longe, bastante longe de briga de rua ou de esquina.

Debatem-se as ideias, a maneira da disposição dos fatos, jamais a pessoa que se valeu delas, ou posicionou assim ou assado. Detalhe importante. Deveria sê-lo por todos. Obviamente. Mas... Sempre existe um “mas” quando o caminho se bifurca, e ao bifurcar-se, opta-se pelo irracional, o de pugilista de esquina, em detrimento do esgrimista, que sabe como rebater-se, defender-se diante de um interlocutor a altura. É isto.

 

Lourembergue Alves é professor universitário e analista político.  



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