• Cuiabá, 23 de Março - 00:00:00

A fatura de 1930 - 1

            Ao observar os movimentos políticos no Brasil nos dois últimos meses e especialmente neste último domingo, não pude deixar de rever a política brasileira dos últimos 70 anos.  Aquelas facções desfilando nas avenidas não são protestos políticos. Elas são nada mais nada menos do que as turbas que sempre precederam grandes movimentos no mundo inteiro em  diversas épocas. Não foram movimentos políticos. Foram movimentos doentios organizados por gente e por organizações doentes.

            Daí ser absolutamente necessário compreender o mínimo que seja da história política relevante do século passado e das duas primeiras décadas deste século.

            Vou tomar a Revolução de 1930 como o ponto de partida, porque a partir dela deveria ter nascido a República rascunhada a partir de 1922. Júlio Prestes foi eleito presidente e derrubado. No lugar, Getúlio Vargas assume como uma espécie de interventor para quatro anos. Permaneceu e o surgiu o chamado Estado Novo que duraria até 1946, sendo ditadura a partir de 1937.

            Cito 1930 como data-chave deste artigo, porque nos regimes de força as lideranças novas são castradas pra sua preservação sem oposição. Mas em 1946 uma pequena elite política conseguiu escrever uma excelente constituição federal que duraria até 1967, no regime dos militares. Sob essa constituição, Getúlio se elegeu em 1950, teve muitas crises e se suicidou em 1954. Mais crises. Juscelino Kubitscheck se elegeu em 1955, em situação difícil e quase nem tomou posse. Veio Jânio Quadros, eleito em extrema radicalização em 1960 e renunciou em agosto de 1961. No lugar João Goulart, em crise desde a posse. Só assumiu sob a condição de aceitar o parlamentarismo imposto pelos militares. Caiu em 1964.

            De 1964 até 1985, os militares governaram. Novo período em que a formação de lideranças políticas foi profundamente cerceado. De1985 até 2020, a formação de novas lideranças políticas foi prejudicada pela desqualificação dos partidos políticos desde a redemocratização. Na verdade, herdaram a história do período militar de 21 anos com todos os defeitos anteriores..

            Tivemos Sarney no lugar de Tancredo Neves. Talvez, se o presidente eleito não tivesse morrido, a costura entre os dois momentos teria dado certo. Veio Collor e o impeachment. Tanto ele quanto Sarney, Itamar Franco vice de Collor, foram arranjos. Fernando Henrique poderia ter sido uma solução porque tinha história política, preparo intelectual, e um grupo de partidários respeitáveis. As manobras do projeto de reeleição desqualificaram-no ao nível dos antecessores. Em 2003 uma guinada ideológica traz Lula ao governo. Mas acabou enfraquecido vítima dos partidos políticos e dos líderes fisiológicos formados nas décadas anteriores. Reelegeu-se sem o mesmo prestígio e deu lugar a Dilma Rousseff que governou à margem do Congresso Nacional. Foi reeleita. Mas durou dois anos e meses e saiu por impeachment. Temer foi um  híbrido de arranjo, oferecido pelo MDB.

            Hoje temos Bolsonaro. Eleito em 2018 enfrenta um país fora do esquadro. Gostaria de encerrar o tema amanhã, justificando que a atual crise e as próximas e ainda as próximas trazem o carimbo de 70 anos de pouca qualidade política no país. Bolsonaro recebeu neste momento a fatura. Outras virão até que a política brasileira amadureça.

 

Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso.

onofreribeiro@onofreribeiro.com.br  www.onofreribeiro.com.br



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