• Cuiabá, 28 de Março - 00:00:00

"O síndico deve trabalhar em duas frentes: uma preventiva e outra repressiva", avalia Miguel Zaim


Foto: Reprodução/Síndico Legal  - Foto: Foto: Reprodução/Síndico Legal Presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB Seccional Mato Grosso, Miguel Zaim. Foto: reprodução/Síndico Legal
Da Redação - FocoCidade

O cenário que envolve um condomínio, no entrelace da relação síndico, condômino e inquilino, nem sempre é assinalada de concordância e cumprimento das regras previstas na legislação e instrumentos como o Regimento Interno.

No linear de atribuições, normas podem ser quebradas, como atrasos no pagamento do rateio, sendo passível de ações extrajudiciais ou sob a tutela da Justiça, com devidas aplicações de sanções e que podem levar à negativação.

Nessa Entrevista da Semana ao FocoCidade, o presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB Seccional Mato Grosso, Miguel Zaim, esclarece pontos sobre o tema, acentuando a necessidade à observação de direitos e deveres.

É nesse contexto que surge a análise acerca da figura do condômino “antissocial”, que pode gerar a desarmonia do esperado equilíbrio na dinâmica da boa convivência coletiva, ficando sujeito a aplicação de punição.

Outro aspecto alertado por Miguel Zaim se refere ao comportamento de personagens do condomínio, que ora podem culminar em excessos, leia-se ofensas e agressão verbal. “Brigas, acusações, interrupções, devem ser evitadas, devendo o presidente coibir de forma enérgica tais atitudes, inclusive punindo o condômino que assim agir com multa previstas nos atos normativos do condomínio, ou em alguns casos mais graves, com a retirada do recinto.”

Nesse enredo e abordando outros pontos, como previsão de voto secreto em assembleia, além de sanção ao síndico em eventual rompimento à ordem, Zaim assinala que para a prática do bom convívio, o síndico deve atuar nas frentes preventiva e repressiva.

Miguel Zaim também é doutor em Ciências Jurídicas e Sociais, Especialista em Direito Imobiliário, Direito e Processo Penal, Direito e Processo Civil, Direito Constitucional, Direito Tributário, e Direito Ambiental.

Confira a entrevista na íntegra:

A relação entre síndicos e condôminos ou inquilinos nem sempre é cordial. O que prevê o direito condominial para casos em que ocorram excessos, por exemplo, em assembleias, em razão de discordância e que acabe em agressão verbal.

Primeiramente, em nome da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Mato Grosso, e em nome da Comissão de Direito Condominial, ao qual temos a honra de presidir, gostaríamos de agradecer a oportunidade de cumprir com um importante papel social, que é compartilhar informações. Você pontuou a questão muito bem. Realmente, nem sempre é cordial. Porém, para nós, o principal antídoto para que não haja excessos em um momento tão importante na vida condominial como são as assembleias e a informação. Veja, em um tribunal do júri, por exemplo, há o respeito à ordem dos trabalhos; as pessoas sabem que aquele momento perante o juiz e júri, ocorre a prática de um ato formal, revestido de forma prevista em lei. De igual forma, nos condomínios, a assembleia é um ato formal, previsto no Código Civil, na Convenção e no Regimento Interno dos condomínios, e deve ocorrer ao menos uma vez por ano, para aprovar o orçamento das despesas, as contribuições dos condôminos e a prestação de contas, e eventualmente eleger o substituto e alterar o Regimento Interno. Verifica-se dessa forma que a as assembleias nos condomínios representam uma grande importância na vida de todos os condôminos, refletindo inclusive no uso das áreas comuns, como por exemplo, piscinas e salão de festas, bem como, nas quotas que cada condômino paga ao condomínio. Brigas, acusações, interrupções, devem ser evitadas, devendo o presidente coibir de forma enérgica tais atitudes, inclusive punindo o condômino que assim agir com multa previstas nos atos normativos do condomínio, ou em alguns casos mais graves, com a retirada do recinto. Tais atitudes não excluem outras, por exemplo, quando há agressão verbal, normalmente, está associado a ofensas contra a honra do síndico, de algum condômino e/ou morador. Nesses casos, é cabível uma ação penal contra o ofensor.

Que leitura faz de um condômino “antissocial” na ótica do direito?

Para o caso de repetida conduta antissocial, mesmo que não contemplada no ato constitutivo, convenção ou regimento do condomínio, a ponto de gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, o valor da multa sobe para o décuplo da quantia da contribuição. É a regra contida no parágrafo único do artigo 1.337: o condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.  Tem-se, na previsão, a conduta do chamado condômino antissocial, que é aquele que não tem uma conduta compatível com a vida em condomínio, que não respeita as limitações naturais dos edifícios coletivos, que viola os mais comezinhos princípios de convivência social, que se atrita com os vizinhos, apresentando um comportamento insuportável. A conduta antissocial ostenta-se de várias maneiras, consistindo as mais comuns na desobediência das regras do regimento interno, como as perturbações do sossego, a algazarra, a colocação de lixo e resíduos em locais inapropriados, o desleixo no fechamento de portões de entrada do condomínio, a ocupação de espaços comuns com veículos ou objetos pessoais, a permissão do ingresso de pessoas duvidosas, o exercício de atividades profissionais em prédio de uso exclusivamente residencial, as posturas inconvenientes, exemplificadas em bebedeiras, uso de tóxicos, brigas, discussões no seio familiar a ponto de gerar incômodos e intranquilidade aos moradores de outras unidades.

Os direitos e deveres de ambos os lados, de forma geral, são estabelecidos em Regimento Interno. E quando não cumpridos, como reiterados atrasos no pagamento do rateio do condomínio, as sanções podem gerar ações na Justiça?

Os direitos e deveres constam na Lei 4.591/1964, no Código Civil, na Convenção e, também, no Regimento Interno. O Código Civil, que derrogou parcialmente a Lei 4.591/1964, prevê direitos e obrigação de uma forma geral, e ampla, se aplicando diretamente em todos os condomínios. Por sua vez, cada condomínio pode estabelecer sanções para as mais variadas condutas. Por isso, sempre alertamos a sociedade, da importância de contar com uma assessoria jurídica especializada, pois cada condomínio, possui liberdade para legislar, e, dessa forma, devemos sempre analisar cada caso, dentro de suas particulares. Com relação ao pagamento de despesas, está expresso no Artigo. 1.336 do Código Civil o dever do condômino: em contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção. O condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito. Com o advento no Novo Código de Processo Civil em 2015, com a lei , débito condominial é título executivo extrajudicial, e portanto, a partir do seu vencimento ele já poderá ser protestado.

Esse seria o caso de incluir o nome do inquilino no SPC?

Conforme entendimento pacífico dos tribunais, a obrigação de pagar o condomínio é inerente a coisa, isto é, tem natureza propter rem, e caso haja protesto em cartório, quem deverá ser protesto é o proprietário, e não o inquilino. O instrumento legislativo oferece algumas possibilidades para o condomínio, por isso é importante uma analise pormenorizada, e individualizada, sempre contanto com o auxílio de advogado. Não se podem confundir atos extrajudiciais com judiciais. No caso extrajudicial, ou seja, sem processo judicial, a negativação de devedor nos órgãos de proteção ao crédito e o protesto do débito, existem inúmeros juristas que dizem não ser possível, nem mesmo se aprovado em assembleia com quórum qualificado de maioria absoluta (2/3). Outros já defendem que, se aprovado em assembleia com quórum qualificado é possível a negativação do devedor e o protesto da dívida. Eu costumo orientar a não tomar estas medidas, mesmo que tal atitude tenha sido aprovada em assembleia com quórum qualificado de maioria absoluta. Afirmo isso porque o novo CPC trouxe um caminho mais seguro. Judicialmente, o novo CPC permite a negativação do devedor e o protesto do título, possibilitando o uso destas ferramentas na busca da cobrança do devedor. Por intermédio do advogado que patrocina a causa, o condomínio pode fazer um requerimento judicial junto ao processo e, autorizado pelo juiz, incluir o nome do devedor nos órgãos de proteção ao crédito possibilitando o protesto da dívida. A partir do momento que há uma autorização judicial para a prática do ato o condomínio se exime de qualquer risco.

Se aplica o dano moral à divulgação da inadimplência do condômino?

Apesar de ser dever do condômino adimplir com suas obrigações com o condomínio, e quando deixa de assim fazê-lo, gera um dano à toda a coletividade, via de regra, não cabe dano moral em relação às pessoas jurídicas. De acordo com o Artigo Art. 1.336. parágrafo 1º do Código Civil o condômino que não pagar a sua contribuição ficará sujeito aos juros moratórios convencionados ou, não sendo previstos, os de um por cento ao mês e multa de até dois por cento sobre o débito. Caso seja ajuizado ação de execução contra o condômino haverá também a correção monetária e os honorários advocatícios e custas judiciais.

A inadimplência gera quais consequências? Impedimento sobre participação em assembleias poderia ser aplicado?

A principal consequência da inadimplência com relação ao condomínio é a aplicação de juros e multa, com o objetivo de compelir o devedor a pagar sua contribuição na data estipulada. Porém, o Código Civil, conforme Art. 1.335, inciso III, o condômino deverá estar quite para votar nas deliberações da assembleia e delas participar. Mesmo não estando em dia com o condomínio, há algumas assembleias em que a presença dos devedores pode ser até necessária, como é o caso de sorteio de vagas da garagem e benfeitorias que peçam 100% de aprovação dos moradores. Se precisar aprovar uma nova cor para a fachada, ou uma destinação diferente para uma área comum do condomínio, é necessário que todos os condôminos concordem. E, para isso, é necessário ouvir a opinião dos inadimplentes, inclusive daqueles que estão devendo.

Quais as possibilidades de votação secreta em assembleia de condomínio?  

Em que pese o Código Civil (Lei nº 10.406/2002), dispor sobre a realização das Assembleias Condominiais em vários dispositivos, não dá muitos detalhes práticos sobre o assunto, deixando-se para às Convenções e Regulamentos Internos dos próprios Condomínios a disciplina sobre os requisitos de realização e votação das Assembleias.  O problema é que na maior parte das vezes referidos documentos não trazem os detalhes necessários para solucionar boa parte das dúvidas dos condôminos, por exemplo, se a votação poderá ser ou não secreta para determinados assunto. A Assembleia costuma ser o ambiente para a formalização das decisões tomadas pelos condôminos, por meio das votações realizadas entre os presentes, observando-se sempre os quóruns de instalações e votação previstos na Convenção. Por sua vez, a principal dificuldade em contar com votação secreta consiste na impossibilidade de contagem dos votos quando o critério estabelecido é o da fração ideal conforme artigo 1.352, parágrafo único, do Código Civil. Dessa forma, não será possível quantificar os votos e poderiam surgir diferenças entre o peso dos votos, posto que as frações seriam diferentes para cada tipo de unidade. Porém, há uma exceção, em havendo outro o critério de contagem dos votos diferente da fração ideal estipulado na Convenção do Condomínio, como nos condomínios em que o voto é auferido “por unidade” (cada condômino teria direito a um voto, independente da fração correspondente à unidade) é admitido o voto secreto, desde que haja prévia estipulação. Em síntese, é perfeitamente possível a realização de assembleia por votação secreta, desde que o voto seja por unidade (não por fração) e antes da votação da pauta seja deliberado pelos condôminos o interesse da votação aberta ou fechada (secreta), até mesmo para que não ocorram surpresas indesejáveis, suscitando alegações de nulidades e futuras impugnações.

Muito se pontua os deveres de condôminos e inquilinos. Mas quais as providências contra um síndico que desviou dinheiro?

Há casos em que o síndico, praticando a gestão temerária de recursos dos condôminos, se apropria de recursos e fundos do condomínio, praticando o crime de apropriação indébita, previsto no Código Penal, Art. 168, com pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa.

Também há muita discussão acerca dos valores cobrados a título de condomínio. Qual o parâmetro?

Basicamente, essa cobrança serve para arcar com as despesas comuns do local, sejam elas fixas ou eventuais. Entre as mais comuns estão o salário dos funcionários (porteiros, faxineiros, zelador, etc.), encargos trabalhistas e contas de energia, água e gás. Os custos administrativos também entram no cálculo, como encargos bancários, pagamento da administradora ou até o eventual desconto para o síndico. Já entre as cotas esporádicas, as mais importantes são os serviços gerais, como manutenção de elevadores, cuidados com as áreas de lazer, conservação de jardins, custeio da decoração da portaria, entre outros. Os itens de limpeza e demais materiais são a parte final dessa equação, que deve ser dividida por todos os moradores.

De forma geral, qual sua orientação para se evitar “dores de cabeça” na relação síndico e inquilino?

O síndico deve trabalhar em duas frentes: uma preventiva e outra repressiva. Quanto à linha preventiva, o síndico deve organizar a contabilidade do condomínio. Esta medida é fundamental. Para nós, o síndico deverá adotar uma postura proativa e observando e acompanhando toda a arrecadação do condomínio, para que a conta não se torne deficitária. Uma contabilidade eficiente, auxilia o gestor de condomínio, ao formatar os boletos em data ideais para recebimento. Envie sempre os boletos com antecedência, e dar a maior publicidade, enviando mensagens por e-mail ou no próprio celular avisando sobre a data de vencimento do condomínio. Outro ponto que gostaríamos de destacar é a necessidade do síndico conscientizar os moradores. Lembre-se de que vale a pena mencionar sobre as consequências que o condomínio sofre ao receber pagamentos atrasados, além dos juros que são impostos, como o comprometimento da manutenção, remuneração dos funcionários, além de outros benefícios que poderão ser reduzidos, afetando assim a rotina de todos. De outro lado, na linha repressiva, a imposição de juros, multa e correção monetária visa coagir o condômino a adimplir com as cotas condominiais. Quando já há algum débito, recomendamos iniciar o processo de Execução Civil da dívida. Com o advento do Novo Código de Processo Civil, a débito condominial passou a ser título executivo extrajudicial. A experiência mostra que quanto mais rápida é realizada a cobrança, maior o êxito. Enviar e-mail ou um telefonema logo nos primeiros dias de atraso e se for o caso ingressar com a ação judicial, que agora ficou muito rápido com o novo código de processo civil, são medidas eficazes.




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