• Cuiabá, 28 de Março - 00:00:00

"Administrador de verdade é aquele que faz mais com menos e não tem receio de prestar contas", dispara presidente da Audicom


Foto: Reprodução  - Foto: Foto: Reprodução Presidente da Audicom-MT, Hebert Villarruel. Foto: Assessoria   
Sonia Fiori - Da Editoria

A realidade na seara das gestões públicas, leia-se o campo municipal, está muito aquém do esperado quando se trata da aplicação na íntegra da legislação sobre o quadro de auditores.

Obstáculos persistem no âmbito da resistência de muitos prefeitos em cumprir a Constituição Federal sobre as rígidas normas de transparência, utilizando subterfúgios de “resistência” ao impor nomeações de indicados em cargos estratégicos, quando os serviços deveriam ser assinalados por auditores concursados.

A batalha da categoria de auditores, o cenário em Mato Grosso e os reflexos à administração pública são observados nesta Entrevista da Semana ao FocoCidade pelo presidente da Associação dos Auditores e Controladores Internos Municipais de Mato Grosso (Audicom-MT), Hebert Villarruel.    

Ele expõe com peculiaridade casos graves verificados em municípios do Estado, projetando a face sombria dos reflexos à população, que é quem paga a conta por gargalos de execuções contrárias à necessária e correta dinâmica.   

“Daí se pergunta, a lealdade que o gestor invocou não se aplica à sua própria pessoa, se gestor quer lealdade a si mesmo que busque no meio de seus correligionários, porque o auditor municipal deve lealdade somente a lei”, dispara.

Taxativo sobre a leitura desse ambiente, ele alfineta aqueles que insistem em não se adequar ao controle. “Mas a coisa é bem simples, não quer ser controlado não entre para a vida pública, pois o dono do dinheiro público é o cidadão e este, temos certeza, gosta de ver onde está sendo aplicado seu dinheiro e, principalmente, ver responsabilizados aqueles que causaram ou deram causa aos seus desvios.”

Confira a entrevista na íntegra:

Existe uma grande discussão acerca de “perseguição” sofrida pela classe de auditores no exercício da controladoria. Como está esse cenário no Estado?

As atividades de controle interno na administração pública nunca foram bem vistas, mas isso só ocorre por parte daqueles que já tendem a cometer ilícitos no âmbito da coisa pública. Nos Municípios então, a coisa chega a ser surreal, uma vez que os gestores, principalmente quando são marinheiros de primeira viagem, tendem a acreditar que podem quase tudo, e sabemos que quando se trata de dinheiro público, existem vários meios e forma de controlar o gasto. A principal delas, é a possibilidade de os auditores internos municipais, poderem ter acesso a todo e qualquer documento. Ressaltamos aqui que não há informação sigilosa em âmbito municipal, sendo que a regra básica é a transparência. Se a todo e qualquer cidadão deve-se dar acesso a qualquer documento, tanto mais para os auditores internos que precisam desse acesso para poder melhor apurar a eficiência e, principalmente, a eficácia do gasto público. Atualmente no Estado existem situações aberrantes de perseguições contra colegas auditores, e podemos citar casos emblemáticos como os de Bom Jesus do Araguaia, Colíder, Nova Bandeirantes. Situações que beiram o absurdo, sempre naquela toada de o gestor acreditar mesmo que pode tudo, que quando vence um pleito eleitoral se investe em algum especial poder sobrenatural, e isso não deveria ocorrer, o verdadeiro gestor, o gestor-raiz (falando em termos atuais) é aquele que está a serviço da população, do cidadão que o escolheu, e essa escolha precisa ser valorizada pelo gestor, e tudo isso passa pelo exercício do poder local respeitando principalmente as leis.

Nos Municípios então, a coisa chega a ser surreal, uma vez que os gestores, principalmente quando são marinheiros de primeira viagem, tendem a acreditar que podem quase tudo.


Esse quadro reflete o receio de gestores públicos sobre a seriedade da aplicação da lei?

Muito já ouvimos falar que tem lei que pega e tem lei que não pega. Em auditoria chamamos de aderência às normas. Seguir a lei, vai muito além de haver alguém em constante vigilância (Controladorias Internas, Tribunais de Contas, Ministério Público, as polícias civil e federal que hoje também assumiram seu papel nos processos de investigação e combate a corrupção), reflete sim a postura ética que o gestor municipal deve ter. Seguir a lei vai muito além de gestor atender recomendações técnicas ou não, vai mesmo de postura ética, de um pensamento voltado à municipalidade. Exemplificando, tivemos uma presidente que foi retirada do cargo por infringir a lei de responsabilidade fiscal. Se analisarmos a LRF, trata-se de um verdadeiro código de conduta ao gestor público, uma lei quase escandinava. Então porque cargas d'água o prefeito que vê seu índice de gasto com pessoal exceder os limites legais, continua contratando, ou buscando alternativas pouco republicanas para fugir dos apontamentos legais. Oras, o orçamento público é quase uma conta de padeiro de tão simples, tenho dinheiro, gasto, não tenho dinheiro, economizo. Não se pode ter o pensamento mesquinho de "deixar a conta pro próximo gestor" pois a conta não será do próximo gestor e sim da própria população. Por isso é importante que o cidadão em seu município acompanhe e se interesse pelo que o seu gestor está fazendo, pois é o cidadão através da cobrança que fará com que o gestor cumpra cada vez mais, e melhor a aplicação da lei.

Então porque cargas d'água o prefeito que vê seu índice de gasto com pessoal exceder os limites legais, continua contratando, ou buscando alternativas pouco republicanas para fugir dos apontamentos legais.


Quais as conseqüências para os profissionais em relação a falta de cumprimento à risca dos direitos garantidos? Retaliações?

As retaliações são de diversas formas, desde assédio moral a perseguição de forma objetiva através da instauração de procedimentos disciplinares. Quase sempre com argumentos tão absurdos que até parecem piada. Tivemos um caso, de o gestor dizer que o auditor faltou com lealdade ao administrador municipal. Daí se pergunta, a lealdade que o gestor invocou não se aplica à sua própria pessoa, se gestor quer lealdade a si mesmo que busque no meio de seus correligionários, porque o auditor municipal deve lealdade somente a lei. Aliás é bom que se diga que o TCE/MT quando gradativamente exigiu a implantação das Controladorias Municipais, estabeleceu como requisito básico do candidato a auditor interno, que este profissional não tenha filiação partidária, ou seja, os auditores e o controladores internos não são "parças" de seus prefeitos. O que deve haver é uma relação de respeito mútuo. Tem gestor que faz bico até quando recebe um documento escrito no cabeçalho "notificação". Mas a coisa é bem simples, não quer ser controlado não entre para a vida pública, pois o dono do dinheiro público é o cidadão e este, temos certeza, gosta de ver onde está sendo aplicado seu dinheiro e, principalmente, ver responsabilizados aqueles que causaram ou deram causa aos seus desvios.

As retaliações são de diversas formas, desde assédio moral a perseguição de forma objetiva através da instauração de procedimentos disciplinares. Quase sempre com argumentos tão absurdos que até parecem piada.


Essa seara pode gerar prejuízos aos cofres públicos?

O conceito de prejuízo ao cofre público, ou dano ao erário como também é conhecido, é bastante complexo, por isso a dificuldade de todos os órgãos de controle, seja interno ou externo de poder ver constatada tal prática. Contudo, todas as práticas que atentem contra a correta aplicação da lei, principalmente da lei de responsabilidade fiscal, podem ensejar em prejuízos aos cofres públicos.

Quais as ações da entidade para fazer valer as prerrogativas?

Nos organizamos na forma de associação não com o objetivo de nos defender de perseguição, pois jamais imaginávamos que muitos gestores teriam ainda essa visão medieval sobre o pífio poder que tem no âmbito municipal. Nos organizamos para podermos debater ideias, buscar parcerias para busca de capacitação e formação. Contudo, com a constante abertura de procedimentos administrativos contra os colegas, tivemos que realinhar algumas ações no sentido de nos defendermos e mostrar para o colega em qualquer lugar deste gigantesco Estado de que ele não está sozinho. Vejamos o caso de Bom Jesus do Araguaia, pequeno Município no noroeste do Estado, prestamos todo o apoio necessário, e hoje acredito que o gestor de lá está mais consciente do papel do controlador, bem como, queremos crer, de seu próprio papel, uma vez que além de prefeito é gestor da coisa pública.


Qual o papel do Tribunal de Contas do Estado (TCE) nesse âmbito e resultados a partir de decisões da Corte de Contas?

O TCE de MT teve e ainda tem o papel fundamental no trabalho das controladorias internas dentro dos Municípios, pois foi a Corte de Contas que exigiu que fossem implantadas como forma de melhorar e trazer qualidade ao gasto público. E aqui, queremos externar nossos agradecimento a todos os presidentes que passaram por aquele Tribunal de Contas, e aqueles que trabalharam bem antes de 2008, que foi o ano estabelecido para o início da implantação das controladorias internas no Estado. Ressalto que o TCE/MT foi corajoso e vanguardista no Brasil, e é modelo para os demais tribunais de contas brasileiros, pois enfrentou um sem número de críticas ao exigir tal implantação no âmbito municipal. Contudo, o TCE/MT continua sendo nosso principal apoiador, não apenas dando respaldo a nossas atividades, corrigindo ilegalidades quando um colega é perseguido bem como, capacitando os auditores naquilo que a Corte de Contas tem como expertise, a realização de auditorias. Com conhecimento técnico, aliado ao respaldo para cada vez mais autônoma e independente atuação das controladorias municipais quem ganha é somente o cidadão, a população a qual estão voltadas todas e quaisquer atividades do controle interno (nos municípios) e do controle externo (atuação ostensiva do TCE/MT).

Como Mato Grosso está em relação ao cumprimento da Constituição Federal sobre o quadro de auditores?

Aos poucos os Municípios e seus gestores ganham e criam maior consciência, que administrar o dinheiro público também precisa de controle. Tem muito gestor bom, eu diria que a maioria, que talvez não possa fazer muita coisa pelo seu município devido a escassez de recursos. Contudo, administrador de verdade é aquele que faz mais com menos, e ainda não tem receio de prestar contas de forma adequada ao seu cidadão, e ainda não teme qualquer ação de controle, seja interno ou externo.

Diria que a nomeação de auditores sem a realização de concurso público é uma prática comum  no Estado?

Essa nomeação é ainda uma execrável realidade, principalmente nos municípios grandes do Estado, que insistem em nomear alguém da "confiança" do prefeito. Esse tipo de nomeação só faz com as ações de controle não possam fluir como deveria, pois, o raciocínio é franciscano de tão simples: quem em sã consciência, iria notificar ou ir contra a pessoa que o nomeou para exercer um cargo que quase sempre ultrapassa cinco mil reais (remuneração considerável dada a realidade atual), e ainda com ingresso pela "porta dos fundos"? Ninguém. E isso tende a refletir mal nas ações de controle, pois, a tendência é que não se apure nada. Para corroborar o que estou dizendo, veja os municípios de MT cujos chefes das UCI são comissionados exclusivos do Prefeito, cruze com o site do TCE/MT e vejam quantas representações contra aquele Município existe? É a pergunta mais simples.

Quem em sã consciência, iria notificar ou ir contra a pessoa que o nomeou para exercer um cargo que quase sempre ultrapassa cinco mil reais. 


Comparado a outros estados, como se comporta MT e quais as perspectivas?

Em que pese todo esse cenário de falta de postura republicana de mal gestores, e repito: mal gestores somente, as atividades de controle interno tem gerado resultados positivos e economia aos cofres públicos nos Municípios, pois são nestes que os impactos são mais sentidos pelo cidadão e atualmente a AUDICOM-MT integra um dos grupos de trabalho da Rede de Controle e combate a corrupção, tudo com o intuito de trazer melhoria nesse gasto público, e estamos sempre dispostos a auxiliar e melhorar a gestão municipal, contudo sendo fiel às leis e principalmente ao cidadão municipal que é quem paga nossos salários.




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