Onofre Ribeiro
Realizou-se ontem em Cuiabá uma audiência pública parte das discussões em torno de projeto de lei que trata da criação de uma lei federal pro Pantanal todo. Participei da entrevista no rádio com o senador Pedro Chaves do Mato Grosso do Sul a respeito mais do tema do que da audiência pública.
O tema é delicado porque o bioma passa por dois estados e dois países. Nasce em Mato Grosso, passa pelo mato Grosso do Sul e pelo Paraguai e Bolívia. Em torno dele correm interesses ecológicos, culturais, econômicos, políticos e até do próprio futuro humano.
Primeiro os de natureza histórica. Desenvolveu uma enorme cultura que correu paralela à cultura econômica da pecuária. Aqui o potencial histórico é extraordinário. A economia pecuária veio de altos e baixos com certa decadência a partir da chegada das pastagens formadas no cerrado com capins africanos nos anos 1980. As extensas áreas sem cercas deram ao Pantanal uma imensidão onde o gado não tinha dono específico. Mais tarde, depois da segunda metade do século 20 a morte dos patriarcas produziu a divisão das áreas em fazendas demarcadas e a perda do sentido original.
Até ali a política, a economia e a cultura mato-grossense dos dois Mato Grossos antes da divisão em 1977 tinham a mesma cara. As grandes lideranças políticas vieram fundamentalmente do Pantanal. Somente depois da divisão e da chegada agricultura aos cerrados, depois de 1980, a pecuária perdeu sua hegemonia. Junto, mudou a política e surgiram os novos líderes políticos ligados ao agronegócio.
Mesmo assim, o Pantanal perdeu a sua importância econômica objetiva, mas não perdeu a importância como futura matriz da economia ambiental, tão pouco valorizada por nós. O mundo caminha depressa na direção das tecnologias e os seres humanos estão gradativamente perdendo importantes pedaços de sua identidade com a Terra.
É possível que no futuro bem próximo o Pantanal rivalize em turismo e referências naturais com todos os demais setores da economia. Quanto mais se desenvolver as ideias em torna da qualidade de vida, mais a natureza terá valor econômico e psicossocial.
Bom recordar que a identidade cultural de Cuiabá é pantaneira, como a de Cáceres, de Corumbá e de mais de uma dezena de cidades nos dois estados. Mais do que discutir, conhecer a essência do Pantanal é fundamental pra se tê-lo vivo para as próximas gerações. Ainda hoje tem mais de 86% preservado.
No futuro valerá mais do que a soma de todos os microchips do mundo.
Onofre Ribeiro é jornalista em Mato Grosso
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