• Cuiabá, 28 de Março - 00:00:00

Imoral e Engorda


Lourembergue Alves

O atual estatuto do Estado brasileiro, logo no seu artigo 1º.  assegura que este é “democrático de direito”. Seus cinco fundamentos sustentam tal afirmação, que é reforçada pelo artigo 5º., onde se pode claramente ler que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Isto, porém, não se dá na prática cotidiana. Pois, a todo instante, tem-se exemplos de desrespeitos a estes preceitos constitucionais. E, estes desrespeitos, que se materializam também na agressão as chamadas minorias e/ou a maioria da população, subtraem destes o direito, o qual já tinha antes atingido de morte a vida em democracia.

Agressões e ataques ampliados à medida que a imoralidade se torna legal. Aqui o campo igualmente é vasto. Basta, por exemplo, passar os olhos por sobre o rosário de penduricalhos e privilégios que se vale um grupo seleto de integrantes dos poderes (Judiciário, Legislativo e Executivo), registrados também nos Ministérios Públicos, Tribunais de Contas e Defensoria Pública. Por nascerem de uma legalidade, ospenduricalhos e privilégios não devem ser jamais considerados usurpação, tampouco roubos ou furtos, como costumeiramente são classificados por uma parte da sociedade. Mas os são completamente imorais.

Ou alguém, em sã consciência, vê moralidade no auxílio moradia para os juízes, ainda que estes tenham casas próprias onde trabalham? Pergunta necessária. Antes que alguém saia com a tese de que o ataque a este auxílio, bem como a outro dos mais de três dezenas de penduricalhos, tem um único objetivo, o de diminuir a importância do Judiciário, e, por tabela, enfraquecer a Lava-Jato. Tese inoportuna e inapropriada, embora sirva para evitar que se debata o problema oriundo do corporativismo e cartorialismo, além de servir para escamotear a imoralidade que se agiganta e se sustenta nestas colunas carcomidas de um Estado moribundo.

Trazer a luz os penduricalhos, os quais se incorporam aos salários (engordando-os) de quem os recebem e servem de instrumentos para se burlarem a lei que impede um agente público de furar o teto constitucional de salário, que é o do ministro do STF, é destruir a imoralidade. Nem de longe é uma agressão ao Judiciário ou a outro poder, ou aos órgãos, muito menosa Lava-jato. Operação que tem levado gente grã-fina para a cadeia. Parte dessa grã-finagem goza de regalias, pois ora faz de suas mansões celas ora é levada a prisão especial. Prisão que se distingue muitíssimo da comum, onde é trancafiada a imensa maioria dos presos.

Isto é uma imoralidade. Imoralidade sustentada pelo artigo 295 do Código de Processo Penal. Artigo, aliás, que nunca deveria ser pensado, imaginado e redigido, se caso o Estado brasileiro fosse de fato democrático de direito. Pois o tal artigo (antes de condenação definitiva) distingue os bandidos em dois grupos, a saber: os especiais e os comuns. Ainda que elestenham cometidos iguais crimes. Isto porque aqueles, os especiais, são portadores de diploma de curso superior. Pode uma aberração desta? Aberração que se agiganta à medida que os olhos escorregam sobre os itens do dito artigo, pois entre os beneficiados se encontram os inscritos no “Livro de Mérito” (IV), os que tiverem exercido a função efetivamente de jurado (X), oficias das Forças Armadas e os militares dos Estados (V), parlamentares (III), ministros (I), incluídos os dos Tribunais de Contas (IX) e os de confissão religiosa (VIII) e magistrados (VI), etc., etc. Um dia desses, se deu uma romaria, encabeçada pela OAB, para vistoriar e avaliar se uma cela especial estava adequada ou não para receber um juiz-prisioneiro.

Parecia uma ópera-bufa, com o manto de faz-de-conta que se vive sob o signo do Estado democrático de direito. O momento não é de rir, nem para chorar. Mas de reflexão. Não para se tomar ciência se um ex-presidente, já condenado em segunda Instância, que não se encaixa em nenhum dos itens do artigo 295, deva ou não ter direito a uma prisão especial (risos). É isto.

 

Lourembergue Alves é professor e estudioso do jogo político.




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