• Cuiabá, 19 de Abril - 00:00:00

?Reforma Trabalhista era necessária e traz pontos positivos?, avalia Marcos Avallone


Vinícius Bruno ? FocoCidade

A Reforma Trabalhista entrou em vigor no sábado (11) e alterou mais de 100 artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Diversas regras vão modificar o formato de contratação e da jornada de trabalho, ampliando a autonomia dos acordos entre as partes e trazendo mais flexibilização em diversos pontos que envolvem a relação entre empregados e empregadores.

Na entrevista desta semana do FocoCidade, o advogado trabalhista Marcos Martinho Avallone Pires, que é presidente da Comissão do Direito do Trabalho da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB/MT), avalia os principais pontos trazidos com a Reforma Trabalhista.

Confira a entrevista na íntegra:

A Reforma Trabalhista realmente era algo necessário?

Creio que sim, a legislação que regula a matéria está desatualizada, a evolução ocorreu tanto no ambiente laboral, como no campo processual. A exemplo, à época da criação da CLT a Justiça do trabalho era ligada ao Poder Executivo, e não ao Judiciário, como é hoje. Existia a figura do juiz classista e poucos eram os advogados que atuavam nos processos existentes.

Quais os principais pontos positivos e os negativos na Reforma?

A reforma tem três eixos: altera regras de caráter material (direito do trabalhador), muda regras de caráter processual (relacionado a tramitação dos processos), bem como regras de caráter administrativo, como multa a ser aplicada pela SRTE – Superintendência Regional do Trabalho e Emprego (Ministério do Trabalho). Do ponto de vista material, o fracionamento de férias, com aval do empregado, pode permitir a este uma melhor condição de descanso, pois um período não poderá ser inferior a 14 dias, enquanto que vedado aos demais, tempo menor do que cinco dias. Outro ponto é a questão da remuneração, pois agora o patrão poderá acertar um plus a ser pago ao empregado, e este poderá, seguramente, não ser integrado à remuneração. Conheço seguimentos que acordaram em CCT (Convenção Coletiva de Trabalho) o pagamento de uma determinada verba ao empregado, fazendo consignar na referida CCT que tal verba não teria natureza salarial. Quando a questão chegou nos Tribunais, estes entenderam contrário ao que havia sido pactuado entre as partes, e as empresas tiveram que pagar os reflexos (13º salário, FGTS, etc.) dessa aludida  verba aos empregados. No ano seguinte as empresas cortaram esse plus, ou seja, os empregados perderem esse direito que teria sido inserido de forma espontânea na CCT, pelas empresas. A partir de agora os patrões podem pagar, por exemplo, prêmios, abonos e diárias para viagem sem limites, sem que estas gerem qualquer reflexo. Vejo que isso possibilitará ao patrão remunerar melhor o seu empregado, pois terá a segurança jurídica de que pagará tão somente esta verba sem que gere outras. A criação do trabalho intermitente poderá trazer para a formalidade, os prestadores de serviço que trabalham por diárias. Ressalto que casos de fraudes ficam sujeitos a declaração de nulidade por parte do Poder Judiciário. Do ponto de vista Processual, acredito que com a fixação de sucumbência recíproca (pagamento de honorários advocatícios ao perdedor) os aventureiros irão desaparecer da Justiça Obreira, pois era muito comum ver ações com pedido de R$100.000,00 para um ex-empregado que trabalhou por apenas um mês. Como passa a funcionar? Se o empregado faz um pedido desse e só ganha, por exemplo, R$5.000,00, temos que ele perdeu R$95.000,00, e sobre esse valor que ele perdeu, ele pagará honorários ao advogado do patrão, cujo percentual varia de 5% a 15%. Se ela ganhou R$5.000,00 e tiver que pagar honorários sucumbenciais de 10% sobre o que perdeu, ele será devedor de R$9.500,00, ou seja, não vai receber os R$5.000,00 que teria direito e ainda vai ficar devendo R$4.500,00. Por isso acredito que as ações trabalhistas, doravante, serão construídas com mais seriedade, onde o empregado vai pedir o que, de fato, lhe é de direito. A contagem do prazo em dias úteis também é outro ponto que vejo como positivo, pois a legislação civil adotou essa forma de contagem no ano de 2015, estando a trabalhista em atraso. Do ponto de vista administrativo, as multas por ausência de anotação de carteira de trabalho passa a ser diferenciada para empresas de grande e de pequeno porte, nada mais do que justo.

A reforma trabalhista poderá trazer melhoras, talvez uma elevação do índice de empregos, mais segurança jurídica para as negociações laborais, mas não será a salvação do País.

Uma das justificativas da Reforma foi a de melhorar o ambiente negocial brasileiro dando “mais segurança jurídica” aos empregadores, fator que para os defensores da medida seria uma saída eficaz para a crise econômica. O senhor concorda com essa premissa? Por quê?

A reforma trabalhista poderá trazer melhoras, talvez uma elevação do índice de empregos, mais segurança jurídica para as negociações laborais, mas não será a salvação do País. Acredito que existem muitas saídas para a crise, e vejo que a maior seria a redução dos gastos da máquina pública, os três poderes consomem muito do que é arrecadado. Contudo, é inevitável que com a reforma, o número de demandas trabalhistas tende a diminuir, de forma que, pelo menos a máquina judiciária do trabalho passará a reduzir gastos.

Flexibilização da contribuição sindical. Como as mudanças da reforma vão ser aplicadas e quais vantagens e desvantagens desta flexibilização?

A contribuição sindical, que corresponde a um dia de trabalho por ano, de cada trabalhador, passa a ser facultativa, ou seja, só poderá ser descontada do salário do empregado se este autorizar. Acredito que isso tenha sido feito para diminuir a ação dos sindicatos sobre um determinado partido político, pois sempre se vê nos meios de comunicação, sindicatos e centrais sindicais promoverem manifestações, pagando viagens, alimentação para manifestações. Se esses entes têm como fonte de recursos a contribuição vinda do trabalhador, o que se conclui é que o trabalhador sempre patrocinou tais manifestações. A supressão da contribuição sindical vai gerar uma revolução no nosso sistema sindical, de forma que terão os sindicatos que desenvolver medidas atrativas ao trabalhador, para que este se sinta incentivado a fazer a colaboração de forma espontânea. Há alguns sindicatos que oferecem muito retorno, como assistência odontológica, clube recreativo entre outras atividades e serviços.

A Reforma pode trazer algum tipo de fragilidade para os empregos?

Sim. Evidente que a reforma, por um lado enfraquece os cofres dos sindicatos, mas por outro ela amplia o poder desses entes, pois as negociações coletivas vão se sobrepor a direitos garantidos por lei (nem todos, os previstos na Constituição Federal estão preservados). Dessa forma, se o sindicado for fraco, talvez tendencioso ou “vendido”, como o que às vezes se vê, isso poderá causar sérios prejuízos aos empregados, com perda efetiva de direitos.

Se o sindicado for fraco, talvez tendencioso ou “vendido”, como o que às vezes se vê, isso poderá causar sérios prejuízos aos empregados, com perda efetiva de direitos.

A perspectiva de negociar a jornada de trabalho, incluindo a hora do almoço é uma novidade eficiente?

Acredito que sim, pois a redução do intervalo do almoço permitirá que o empregado vá embora mais cedo. Por outro lado, vejo que os que são contra, usam do argumento de que isso cansaria mais o empregado. Contudo, qual o empregador que vai querer um empregado cansado? Este produz menos. Na jornada de 12h de trabalho por 36h de descanso, veja que, apesar do empregado trabalhar em jornada estressante em um dia, mas em compensação ele terá o dia seguinte inteiro para se recompor, fato que lhe favorece muito, pois terá que se descolar ao trabalho, apenas metade dos dias que normalmente iria, economizando esse tempo. Só ressalvo minha discordância quanto a alguns aspectos que esta norma trouxe, como o prolongamento de jornada noturna, compensação de feriados, etc., isso é perda de direito.

O acordado prevalecendo sobre o legislado pode trazer insegurança jurídica? Quais riscos essa possibilidade traz?

A construção do acordo deve seguir os estritos limites previstos na legislação, do contrário poderá ser anulado, já que os direitos garantidos na Constituição Federal não poder ser contrariados. Por outro lado construído nos moldes da lei, sim, o acordo dará segurança jurídica às partes, em especial aos empregadores.

Entendendo que o princípio da hipossuficiência é uma garantia ao trabalhador, como a Reforma Trabalhista protege esse princípio?

A reforma imputa ao empregado a obrigação de pagar custas processuais na hipótese desse ensejar o arquivamento do processo por ausência na audiência, bem como em pagar os honorários periciais em caso de perda da verba correlata. Antes o empregado era dispensado de todos esses pagamentos. Ao que vejo, o pagamento das custas se impõe uma vez que ao ajuizar uma ação, o empregado faz movimentar toda a máquina judiciária, como a criação do processo, os empregados para movimentar esse processo, serviços de correio e oficial de justiça para realizar a notificação do reclamado, pauta de audiência, etc., No final ele não comparece e nenhuma pena sofre. Doravante, se ele tem um motivo justificado para a ausência, deve mostrar isso ao juízo para se isentar do pagamento das custas, do contrário, terá que arcar com as mesmas, pois o mínimo que se espera de quem busca a Justiça, é a responsabilidade de se fazer presente na audiência. Não vejo contrariedade alguma ao princípio da hipossuficiência aí. Agora quanto aos honorários de perito, este tem que ser visto com certa ressalva, mas acredito que a motivação tenha vindo dos inúmeros pedidos infundados de adicional de insalubridade, ou seja, em uma demanda, mesmo ciente de que o ambiente de trabalho não era insalubre, mesmo assim muitos empregados faziam tal pedido visto que nenhuma consequência lhe causaria.

O fracionamento das férias e a determinação pelo empregador de quando e como essas férias poderão ser tiradas pode trazer algum risco para o empregado?

As férias só podem ser fracionadas se houver concordância do empregado, ou seja, quem define, pelo menos na teoria, é o empregado. Eventuais fraudes e medidas coercitivas poderão ser objetos de demanda judicial.




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