• Cuiabá, 29 de Março - 00:00:00

ONG em Cuiabá prega controle social como forma preventiva de combater a corrupção


Vinícius Bruno ? Especial para o FocoCidade

O controle sobre os gastos  públicos é, em regra, exercido pelas instituições criadas com esse fim em específico, como é o caso do Tribunal de Contas do Estado, responsável por julgar contas dos municípios e do Estado. Mas quando esses órgãos falham, ou são alvo de escândalos de corrupção, a exemplo do que aconteceu em Mato Grosso, onde cinco conselheiros do TCE foram afastados por suposto recebimento de propina, a quem sobra a idoneidade de controlador os gastos públicos?

Pensando em ser uma resposta eficiente a esta interrogação, a Organização Não Governamental Controle Social de Cuiabá cidadãos voluntários, cujo interesse é exercer o controle sobre os gastos públicos.

Na mira da ONG está a Prefeitura de Cuiabá, que para a vice-presidente de controle social da ONG Controle Social de Cuiabá, Elda Valim, a maior preocupação tem sido os contratos de adesão realizados pela prefeitura, ao invés de realização de licitações.

Elda Valim é economista e advogada, e foi auditora fiscal do Tribunal de Contas da União por 17 anos. Aposentada, ela é voluntária da ONG Controle Social de Cuiabá e é a entrevistada desta semana do site FocoCidade.

Confira a entrevista na íntegra:

 

O que tem preocupado a ONG Controle Social em relação à Prefeitura de Cuiabá?

A constituição de 1988 e a Lei de Licitações tem alguns princípios. Por exemplo, não cabe ao gestor escolher de qual fornecedor queira comprar. Tem que ser feita uma escolha com critérios objetivos, sendo que o mais comum é o preço. Neste caso aplica-se o princípio da isonomia, que na prática é dar chance para qualquer fornecedor que tenha produto de interesse para a administração pública, e para isso, chama-se o número máximo de fornecedores para conseguir um melhor preço. Dessa forma não se escolhe quem vai ser contratado, será o preço a definir essa concorrência, e ainda se empatar o preço é realizado um sorteio. Não tem como haver nenhuma influência da vontade do gestor. Temos visto em Cuiabá a ausência de licitação. Quando o gestor faz o contrato de adesão, ele não convida a todos os que estão no mercado, o convite é direcionado apenas a quem já tem contrato com a administração pública, o que fere o princípio da isonomia. Também se fere o princípio da impessoalidade, porque nesse sistema, a lei prevê que é possível comprar por meio de adesão se houver uma vantagem muito grande para a administração. O problema em Cuiabá é que não há clareza se as adesões que vem sendo realizadas são as mais vantajosas para a administração pública. Essa é a nossa preocupação. Pois, a licitação virou exceção.

A vontade do gestor é ter liberdade, mas a lei restringe o gestor e manda fazer conforme regras específicas.

 

O que tem motivado a não realização de licitações e a preferência por adesão, em Cuiabá?

É a falta de controle, porque a tendência do gestor é de fazer o que quer. A vontade do gestor é ter liberdade, mas a lei restringe o gestor e manda fazer conforme regras específicas. A prefeitura está agindo dessa forma porque falta tanto para a população quanto para os órgãos de controle chegar para a administração pública e dizer: chega, não pode ser assim.

A ONG Controle Social traz essa perspectiva de exercer controle por meio dos cidadãos, como isso é possível?

É uma auditoria popular. E qualquer cidadão pode fazer essa papel. Nós nos propusemos a fazer isso, a monitorar os gastos, verificar todos os dias no diário oficial o que está sendo contratado, os valores, e qualquer pessoa pode nos ajudar. Desde que tenha as informações, que o Observatório consegue por meio da Lei de Acesso à informação. Se o cidadão tem curiosidade de ver os detalhes do contrato. E eu convido cada um dos cuiabanos que nos ajude.

O cidadão tem noção do que é eficiente ou não. Mesmo sem indicadores o cidadão sabe se o posto de saúde está atendendo bem ou não, sabe se o transporte está bom.

 

Se a adesão não é contra a lei, porque ela causa tanta estranheza?

Não é contra a lei, mas é contra os princípios. E eu acredito que os princípios são mais importantes que a lei. Existem muitas tecnologia, mas para fiscalizar precisamos ter acesso à nota fiscal, porque ela traz a quantidade adquirida, a unidade de medida, o preço unitário, o preço total e o fornecedor. Essas informações são suficientes para o contribuinte dizer se aquela compra está certa ou errada, se está cara ou barata. Por outro lado, estamos tendo uma dificuldade enorme para conseguir essas notas fiscais. Gostaríamos que essas notas fiscais ficassem disponíveis na internet.

A senhora citou muito os princípios trazidos pelo artigo 37 da Constituição Federal (1988), que direcionam a gestão pública, mas se percebe que um desses princípios tem sido bastante desrespeitado ultimamente, que é o princípio da eficiência.  É visível ao andar pelas ruas de Cuiabá ou em outras cidades do país, que muito se tenta fazer, mas que não é eficiente. Como mensurar a eficiência?

O Observatório Social do Brasil tem uma sistemática de criar indicadores de gestão e com esses indicadores é possível avaliar a eficiência. Mas o cidadão tem noção do que é eficiente ou não. Mesmo sem indicadores o cidadão sabe se o posto de saúde está atendendo bem ou não, sabe se o transporte está bom. Ou seja, existe uma avaliação subjetiva que cada cidadão faz para saber se está sendo eficiente ou não. Em breve, o Observatório Social de Cuiabá também vai fazer essa avaliação da qualidade.

Com poucas pessoas se consegue fazer um bom trabalho de controle social, enquanto que com eleições precisa-se de muita gente consciente para poder votar certo.

Do ponto de vista político, muitas pessoas que hoje estão no poder já fizeram da política uma carreira. Pode-se dizer que essa realidade é fruto da ideia que muitos eleitores ainda conserva: candidato A ou B rouba, mas faz. Como combater isso?

Nossa proposta é combater a corrupção de forma preventiva através da transparência. Porque acreditamos que a transparência muda a forma de fazer. Se existe a consciência de que um terceiro vai ver o que você está fazendo, então se muda de atitude. É uma espécie de prevenção. A proposta do Observatório é prevenir que não aconteça, e isso é bom até para o político, já que evita ele ser corrupto, em tese. Temos que cuidar de forma preventiva. O dinheiro público, principalmente na saúde, precisa estar no tempo certo a serviço da população.

O controle feito pela sociedade é a última esperança? Ou ainda é possível ter esperança no controle exercido por órgãos instituídos para isso, a exemplo do TCE/MT onde 5 conselheiros foram afastados suspeitos de se envolver em corrupção?

Creio muito e dedico minha vida pelo controle social, porque acredito que dessa forma nós podemos mudar o país. Com poucas pessoas a gente consegue fazer um bom trabalho, enquanto que com eleições precisa-se de muita gente consciente para poder votar certo. No controle social você não precisa de muita gente, basta que se use as ferramentas para acessar as informações e analisar se estão corretas. O Observatório também se utiliza dos órgãos de controle instituídos para que exista a garantia que o dinheiro público seja bem usado. Primeiro nós vamos ao Prefeito, se ele não nos atende, vamos à Câmara, se essa não resolve, provocamos o Ministério Público.




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